Precisamos de salvar a nossa democracia

As conquistas da nossa democracia eram até há bem poucos dias um bem inalienável, eram valores seguros que ninguém ousava sequer pensar que poderíamos um dia vir a perdê-los.

A Revolução dos cravos trouxe modernidade ao nosso país, a classe média surgiu e ao mesmo tempo o ensino massificou-se a todos os níveis, tornou-se obrigatório até o termo do ensino secundário e fez com que os indicadores de frequência no ensino superior ultrapassassem a média europeia. A criação do Serviço Nacional de Saúde, apesar de todos os constrangimentos existentes e que diariamente ouvimos nas notícias, veio a aumentar em muito a esperança de vida da população. Na década de 70 do século passado situava-se nos 66 anos, agora, está nos 83 anos. Um indicador que diz muito sobre a melhoria da nossa condição de vida.

Apesar da crise habitacional que vivemos nos dias de hoje, o certo é que estes 50 anos de democracia proporcionaram à maioria da população uma casa para viver, seja ela alugada, comprada, ou em habitação social. Quem não se lembra da linha de barracas que cercava Lisboa, ou as inúmeras furnas que existiam aqui, na nossa cidade do Funchal?

A massificação do movimento sindical veio aumentar significativamente a qualidade do trabalho, impondo regras para as diferentes categorias profissionais, assim como lutou para que o salário médio dos portugueses subisse significativamente. Em 1975 um português ganhava em média cerca de 20€, o que ajustado aos dias de hoje seria o equivalente a receberem 600€, enquanto que em 2024 o valor do salário médio situou-se acima dos 1500€.

E mesmo as famílias com maiores dificuldades, passaram a ter um leque de apoios sociais, o que lhes permite ter um nível de vida bastante melhor do que poderiam ambicionar nessa não tão longínqua década de 1970.

Poderia continuar a dar mais exemplos de como a nossa vida melhorou de forma exponencial desde que o fascismo que governou Portugal, foi corrido por homens com espingardas com cravos na ponta. Mas, o foco que hoje quero transmitir é que essas conquistas da nossa democracia não são um bem garantido. O discurso da extrema direita é perigoso, é racista, é xenófobo, e ao vermos o seu crescimento, temos de refletir sobre que caminhos queremos trilhar daqui para a frente.

O eleitorado típico da extrema direita em Portugal é jovem. Jovens adultos que não tiveram que lutar para conquistar os bens que abril nos trouxe, que não equacionam sequer a possibilidade de os perderem, como por exemplo, o direito a emitir a sua própria opinião. Tudo isso está em risco, basta ver o discurso do líder desse partido na noite eleitoral, parecia um garoto que tinha ganho o torneio do bairro e cuspia atrocidades contra os seus adversários políticos. O perigo está aí.

É preciso refletir, os partidos tradicionais, que são o garante dos princípios democráticos, têm de refletir. Apesar do grande derrotado nas últimas eleições ter sido o PS, não tenhamos qualquer dúvida que se seguirmos os mesmos caminhos, daqui a 4 anos será a AD a levar com a derrota. O populismo precisa de ser combatido e o modo de fazer política tem de ser adequado aos dias de hoje.

Precisamos de honrar os fundadores da nossa democracia, com especial destaque para o saudoso Mário Soares. Precisamos de incutir nos jovens a importância da sua participação política, dos seus pensamentos, precisamos de modernizar a forma de fazer política, de transmitir a mensagem e acima de tudo, precisamos de pessoas capazes de olhar para o futuro, de uma forma progressista, mas sempre, sempre, humanista.

Precisamos de salvar a nossa democracia.

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