Cadeiras
Era comum ouvir-se, entre os mais novos, uma piada que tanto fazia rir a turma toda, como ruborizava o aluno que ficava sem cadeira.
Dizia assim: quem foi ao mar perdeu o seu lugar!
Era irritante e, ao mesmo tempo, uma sentença. Regra geral, a ‘vítima’ ficava de pé até ao fim da aula ou da viagem de autocarro.
Mas isso era antigamente.
Nos dias de hoje, quem vai ao mar pode ir descansado que tem lugar garantido. Seja nas escolas, nos bancos da igreja ou nas cadeiras do poder e, alguns, até mesmo na oposição têm sofá para a vida toda.
Algumas mudanças governativas que estão a ser operadas nesta altura mostram a versatilidade de competências e de conhecimentos. Talvez mais estes do que aquelas. E isso explica, em parte, que quem não foi competente na gestão de um setor possa tentar outro de área completamente diferente.
De forma simplista, a ideia é que a dança das cadeiras continua. A diferença é que arranjaram mais cadeiras e há lugar para quase todos.
Mas também é justo reconhecer que a repetição de escolhas em diferentes áreas demonstra bem como é curta a manta de quadros disponíveis para o exercício de funções governativas.
Essa indisponibilidade explica-se essencialmente por duas razões.
A primeira, prende-se com a elevada exposição mediática a que qualquer protagonista está sujeito. Mais do que o elevado grau de escrutínio público, é a chacota pública que afasta os bons quadros que não se querem sujeitar às sentenças dos anónimos das redes sociais sem regras. E com razão!
A segunda, está relacionada com a fraca capacidade de os cargos públicos atraírem competentes quadros que são mais bem pagos pelas empresas.
Tudo isso explica que a dança de cadeiras seja hoje um jogo em que entram essencialmente os cidadãos com gosto pela causa pública, dispostos ao castigo severo de quem nada faz e parece tudo saber.
Papa
Já quase tudo foi dito sobre a bondade do Papa que falava para o povo.
Foi uma semana intensa de justas homenagens, pessoais e coletivas. De genuínas manifestações de pesar vindas de gente da Igreja e de tantos outros que dispensam a sacristia, mas não deixam de pensar.
Foi bonito ver tanta reverência a Francisco.
Significa que a mensagem passou. Que o sermão não caiu em saco roto. Que até os mais distantes se aproximaram para escutar. E que retiveram ideias concretas e sabem o que disse o Papa em vida.
A importância da paz em tempo de guerra.
A defesa de uma igreja inclusiva e para todos.
A preocupação com os mais pobres.
O discurso aparentemente simples, mas carregado de saber.
Os ensinamentos que deixa, como a simplicidade com que antecipou o fim.
E a sua biografia que promete ser um novo capítulo do longo legado.
A Deus, Francisco.
Normalizar? Não!
Começa a ser uma marca de cada 25 de Abril a tentativa de alguns setores da sociedade em normalizar a Revolução.
O esforço para dar a entender aos mais novos que aquilo foi quase uma coisa de nada. Que isto da liberdade é algo normal que herdámos porque sim.
Não foi.
Foi uma conquista dura que marcou uma diferença de regime e um tempo novo, esse sim, herdado pelas novas gerações.
O cravo é importante, mas é apenas um símbolo. Usa quem quer. Mas a essência de Abril não pode ser esquecida, nem amordaçada, nem colocada no bolso de alguns.
A ideia de suavizar uma Revolução é uma forma de calar a Revolução. De tentar apagar a História. De suavizar o discurso. De trocar a evocação de um dia importante por mais um dia no shopping.
Abril é muito mais do que isso.