Ao segundo dia do quarto mês deste ano de 2025, Trump distribuiu taxas aduaneiras a rodos. Num repente, um fedor intenso a mofo invadiu o ar, tal foi a quantidade de casacas despidas, sacudidas e viradas do avesso.
Impregnadas de obsoleto suor, as casacas exibiam, antes da manobra acima descrita, crachás e dísticos contra o mercado livre, o empreendedorismo além-fronteiras ou à globalização capitalista.
O que era preciso era proteger as economias nacionais (nacionalizadas ou obedientes ao Estado, conforme gostos mais orientais ou mediterrâneos, respectivamente), mais ou menos fechadas aos desmandos dos vis capitalistas estrangeiros.
Uma vez viradas, as casacas exibiam agora crachás de Adam Smith e seus quejandos. Os seus portadores apelavam a que se deixasse o destino do comércio internacional à mão invisível, ao invés da pesada mão do requentado e pouco fresco Presidente dos EUA, recentemente empossado. De repente, quanto mais livre o mercado, melhor.
Mas foi sol de pouca dura.
Quem ouve os debates que antecipam a campanha para a antecipada eleição legislativa, em Portugal, percebe logo que a viragem do casaco foi apenas superficial.
Afinal, isso do mercado livre é só para contrariar o maluco americano, que aqui no burgo só o Estado (o de cada partido, entenda-se), pode definir o que produzir, a quem o vender e por que preço o fazer. Isso de ter que saber interpretar o que os consumidores necessitam ou pretendem, produzir ao melhor preço e vender a um preço que não afaste o consumidor-alvo, é falácia do infame capitalista.
O que interessa é ver um problema e atirar-se a ele sem o esforço de entender todas as suas causas, ou as consequências da solução proposta. Tudo se resolve com um agitar da caneta mágica que regurgita leis, proíbe e obriga.
Talvez a teimosia persista porque também aqui há aqui mercado; e é competitivo. A troca é direta, sem moeda, mas não deixa de ser uma troca de capitais. O capital do eleitor é o voto e este troca-o pela probabilidade de receber mais direitos (não naturais), mais subsídios, mais propendas. E a capacidade de os conceder, de usar o músculo do Estado para forçar o Bem Comum de cada um, é o capital dos partidos vencedores.
Como na bolsa de valores, o eleitor investe o seu voto naquele que lhe parece prometer mais a seu gosto, e com suficiente potencial de futura influência na tomada de decisão. A matéria-prima e produto de consumo são, invariavelmente, aqueles cujo trabalho é taxado em sede de IRS, que não são assim tantos em Portugal. (O IVA é um imposto que castiga todo o consumo, encarecendo tudo em que toca, sendo o mais progressivo dos grandes impostos, uma vez que paga mais quem consome mais e mais caro.)
Mal sabia o doidivanas americano que, ao castigar o seu mercado interno com a libertação (Orwell explica esta contradição nos termos), estaria a empurrar os doidivanas do “Estado acima de tudo” deste lado do Atlântico para o vislumbre das vantagens do mercado livre. Mal sabia este doidivanas que aqui vos escreve que o vislumbre não passaria de uma temporária nesga na janela. Na porta nem uma frincha.
Asseguram-nos, os candidatos ao nosso voto, de que eles nos resolvem tudo, numa vidinha organizada por eles, à moda deles, para nosso bem. Em troca taxam os outros. Sempre os outros. Mas os outros, de uma forma ou de outra, mais cedo do que tarde, somos sempre nós. Como são os consumidores norte-americanos quem vai pagar mais pelos produtos importados; para o bem deles, diz o seu governo.