Para que o voto valha a pena

Embora fugindo às datas “determinadas” pela maioria dos políticos regionais, o Presidente da República marcou as eleições para a Assembleia Legislativa da Madeira para o próximo dia 23 de março. Com algumas novas regras, mas com o mesmo sistema de apuramento de mandatos, é pouco previsível que haja grandes e/ou significativas alterações ao resultado de há oito meses atrás. Ou seja, não prevejo que a composição do Parlamento, apurada num só círculo e pelo sistema de Hondt em vigor, seja substancialmente distinta da que ainda temos e muito menos que haja uma maioria absoluta de um só partido.

Acresce que somos chamados a eleger um Parlamento que não pode ser dissolvido durante um período superior a um ano o que significa que durante esse espaço de tempo ou há a capacidade de designar um Governo que veja o seu programa aprovado ou estaremos vocacionados a um longo período em gestão de duodécimos sem orçamento novo e sem novas adjudicações.

Note-se, porém, que a responsabilidade que se exige não é aos eleitores, mas aos eleitos. Estar a colocar na eleição o remédio que os eleitos não conseguiram prescrever é tentar inverter as coisas. O voto deve ser livre e em consciência e os eleitos nada mais devem do que respeitar o que o voto determinar. Não contem os candidatos com a legitimação de teimosias e arrogâncias que nos levaram a este desfecho. Exijam a si próprios a clarividência e a capacidade de entender o que o voto vos determinar e com os mandatos apurados encontrar a melhor solução governativa para a Madeira.

É por isso essencial que os madeirenses sejam esclarecidos sobre esta matéria antes do dia da eleição: como asseguram a governabilidade da Madeira? Se o eleitorado não vos der os resultados que almejam (e que tudo indica que não será substancialmente diferente do que tivemos há oito meses), o que vão fazer para oferecer à Região um Governo com programa aprovado no parlamento?

Além disso, importa falar de coisas que andam preocupantemente arredadas do nosso discurso político. A Região, particularmente depois do período pandémico, provou que a maioria das suas grandes questões depende do exterior. Não só o financiamento das políticas sociais, a acessibilidade ou as definições económicas, mas particularmente a visão integrada que o Mundo exige não se coaduna com políticas de isolamento e de exacerbado umbiguismo. Perspetivar a Madeira, a ocupação do seu território, o bem estar das suas populações, o modelo de desenvolvimento económico e a sustentabilidade das suas políticas, é cada vez menos uma questão de “competências próprias” e cada vez mais uma capacidade de ser compreendida e integrada no espaço nacional e europeu.

Recentemente anunciou-se o fim dos estudos sobre a necessária revisão da lei das finanças regionais e as estruturas partidárias regionais, com o seu silêncio, parecem desconhecer o que aí se perspetiva. O Governo da República legisla sobre a mobilidade dos cidadãos ou sobre o urbanismo, e estas ilhas parecem surpreendidas com tais decisões.

Tal como aconteceu na recente reunião do Conselho de Estado, com um primeiro-ministro fisicamente ausente e um Presidente da República dando sinais de enfado, o Arquipélago da Madeira aparenta ser a jangada de pedra que vagueia e se distancia do espaço nacional numa solidão que o diminui.

Seria de utilidade manifesta que as eleições de março trouxessem respostas de responsabilidade regional e propostas de relacionamento com o Estado. Urge saber de pontes e de entendimentos e dispensam-se autismos políticos que, a manterem-se, levam-nos ao abismo.

Para que valha a pena ir votar!

Ricardo Vieira escreve ao domingo, de 4 em 4 semanas.

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