Eram sobretudo mulheres. Mulheres que tinham poderes quase sobrenaturais.
Na minha infância, era comum por vezes ouvir falar delas. Cheguei inclusivamente a presenciar algumas das suas “curas”. Eram chamadas ou procuradas para tentar resolver diversos males.
Para os mais pequenos, como eu, essas mulheres misteriosas tinham um poder quase mágico: afastar medos e resolver males inexplicáveis. Muitas já eram idosas, vestiam-se de preto com lenço também preto na cabeça, geralmente por causa da viuvez, pois, na época, as viúvas mantinham o luto durante anos, algumas até ao fim da vida.
As curandeiras eram procuradas para tentar resolver uma série de problemas, desde doenças misteriosas ao “mau-olhado”.
Não curavam apenas pessoas, mas também animais. Dizia-se que conseguiam livrar porcos e vacas de “males invisíveis” que os deixavam abatidos. Neste particular nos palheiros ou nos chiqueiros, aproximavam-se dos animais e faziam o seu “trabalho”. Quanto às pessoas, eram requisitadas para tanta coisa. Tinham um jeito peculiar de tratar entorses. Quando alguém por algum motivo sofria uma entorse, a curandeira era chamada para ajudar a resolver o problema. Para além da massagem, também associavam uma reza a que chamavam “curar de aberto”. Manipulavam a zona afetada com as mãos, enquanto murmuravam palavras ou rezas que quase não se percebia o que diziam. Os resultados, segundo quem as procurava, eram surpreendentes.
Em Santana, desempenhavam um papel especial no cuidado pós-parto. As mães recorriam a elas para receber massagens abdominais que ajudavam o útero a voltar ao lugar. Também eram chamadas para tratar as crianças e os adultos de problemas comuns, como “bucho virado” (barriga inchada), falta de apetite ou dores abdominais. Estas massagens não só aliviavam os sintomas como traziam conforto e bem-estar.
A cura para o “mau-olhado” era uma das práticas mais procuradas. As curandeiras utilizavam uma cruz de alecrim, que colocavam junto à cabeça da pessoa, enquanto recitavam orações. Por vezes, queimavam a cruz, espalhando o cheiro do alecrim queimado pela casa, como forma de proteção. Era um ritual de gestos e de fé que muitos acreditavam ser eficaz.
Naquele tempo, em que os médicos e os cuidados de saúde estavam longe e os recursos eram escassos, as curandeiras eram a solução para muitos males. Não se tratava apenas de aliviar sintomas, mas também de oferecer conforto emocional e espiritual. Eram um elo entre o corpo e o espírito, devolvendo a quem as procurava uma sensação de segurança que a ciência, na sua frieza, não conseguia proporcionar.
Nesta abordagem não estou a confundir “bruxaria” com este tipo de tratamento popular. A “bruxaria” que suponho que ainda existe, até tinha outro tipo de conotação que não propriamente a de resolver pequenos problemas de saúde.
Hoje, essas histórias quase que pertencem ao passado, a um tempo em que o inexplicável tinha tanto poder quanto a medicina moderna. Mais do que tratar o corpo, as curandeiras cuidavam da alma, deixando-nos uma lição preciosa: por vezes, o que mais precisamos não é de uma receita, mas de algum conforto emocional que ajuda a aliviar sofrimentos.