o próximo dia 6 de outubro celebra-se o Dia Internacional da Geodiversidade. Esta data, ainda recente no calendário mundial, procura chamar a atenção para um valor essencial da Natureza que nem sempre recebe o devido reconhecimento, a diversidade geológica da Terra. Se estamos habituados a ouvir falar em biodiversidade (a variedade de espécies e habitats), menos familiar é-nos o termo geodiversidade, apesar de lhe estarmos expostos diariamente.
Na verdade, a geodiversidade é a base sobre a qual assenta a vida. Rochas, minerais, fósseis, relevos, solos e processos naturais, como o vulcanismo ou a erosão, constituem o alicerce do mundo vivo. Sem este suporte, não existiriam ecossistemas, nem agricultura, nem água doce armazenada nos aquíferos, nem paisagens que marcam a nossa memória coletiva.
No arquipélago da Madeira, esta realidade é particularmente evidente. Apesar de sermos internacionalmente conhecidos pela biodiversidade, como a Laurissilva, Património Mundial da UNESCO, ou a riqueza em espécies endémicas que habitam o nosso território, a nossa identidade natural não se explica sem falarmos sobre geodiversidade e sobre os seus exemplos mais relevantes, que constituem o seu património geológico. O arquipélago nasceu da força do fogo e foi moldado pela paciência dos fenómenos erosivos. A conjugação entre processos de construção, como as erupções vulcânicas, e processos destrutivos, como a erosão das arribas e a incisão das ribeiras, deu origem a paisagens que hoje são ícones culturais, turísticos e científicos.
Quem não reconhece o Véu da Noiva, no norte da ilha? A queda de água que impressiona viajantes há décadas, é também, o testemunho de um fenómeno geológico: a foz suspensa da Ribeira de João Delgado, criada porque o mar avançou sobre a costa mais depressa do que a ribeira conseguiu escavar o vale. Um exemplo claro de como a geologia não é estática, mas um processo em constante transformação.
A Ponta de São Lourenço, no extremo oriental da ilha, é um verdadeiro museu geológico ao ar livre. Nas suas arribas coloridas vemos capítulos diferentes da história eruptiva da Madeira, antigos vulcões, como o Cone de Nossa Sr.ª da Piedade, falhas, intrusões de magma na forma de filões, dunas de areia modeladas pelo vento, bem como a única praia de areia clara da Madeira.
O Pico de Ana Ferreira, na ilha do Porto Santo, guarda nas suas colunas prismáticas um dos mais belos exemplos de “geologia esculpida”. À primeira vista parecem paredes talhadas por mãos humanas, mas na realidade são prismas de disjunção, resultantes da contração do magma ao arrefecer no interior de uma conduta vulcânica.
Estes lugares e muitos outros, como o Cabo Girão, o Curral das Freiras ou o Porto Moniz, não são apenas cartões-postais, são capítulos de um livro aberto sobre a história do nosso território.
Consciente desta importância, a Região Autónoma da Madeira tem vindo a dar passos firmes na valorização e conservação do seu património geológico. A criação de 15 Monumentos Naturais, como a Ponta de São Lourenço, o Maciço Montanhoso Central ou o Glaciar de Planalto do Paul da Serra, traduz a vontade política e técnica de reconhecer oficialmente áreas de elevado valor geológico. São medidas que conferem proteção legal, mas também oportunidades de investigação, educação e turismo sustentável. Porque conservar a geodiversidade não significa fechar o território, mas sim criar condições para que mais pessoas possam conhecer, interpretar e respeitar o que ali está em jogo.
É neste contexto que o Dia Internacional da Geodiversidade assume especial relevância para nós madeirenses. Celebrá-lo não é apenas seguir uma recomendação internacional, é olhar para a nossa terra com olhos novos. É perceber que a Laurissilva só existe porque há montanhas e vales, que as espécies endémicas só se desenvolveram porque houve ilhas isoladas a emergir do Atlântico, que os trilhos e miradouros que hoje percorremos nasceram de processos geológicos com milhões de anos.
Proteger a geodiversidade é proteger a memória mais antiga das nossas ilhas. É garantir que as futuras gerações não herdem apenas belas paisagens, mas também o conhecimento de como elas nasceram e o porquê de merecerem ser cuidadas. Neste Dia Internacional da Geodiversidade, celebremos não apenas o que vemos, mas também que as forças as criaram essa geodiversidade. O fogo da lava, a paciência da água, a dureza da pedra e a passagem do tempo.