Kirk e as guerras inúteis

A morte de Charlie Kirk deveria ter sido um momento de reflexão. Um instante para pensar sobre o estado do mundo, sobre o que nos une e o que nos separa. Mas rapidamente se tornou mais uma arma numa guerra inútil entre esquerda e direita, entre rótulos e trincheiras, entre quem grita mais alto e quem escuta menos.

Não é Kirk o problema. O problema são todos os que se aproveitam da sua figura — em vida e em morte — para alimentar narrativas polarizadas, para justificar radicalismos, para perpetuar divisões. Transformaram-no num símbolo, não de ideias, mas de confrontos. E com isso, perderam a oportunidade de aprender com o que realmente importa.

Vivemos numa sociedade benevolente e inculta. Esquecemos a história, ignoramos os ciclos, repetimos os erros. Enaltecemos quem propaga discursos de ódio, quem faz de tudo para garantir a sua “razão”, mesmo que isso signifique silenciar o outro. E tantos anos depois, continuamos a discutir o básico, o lógico, o que já foi comprovado cientificamente.

A Igreja e os conservadores mais rígidos continuam a tentar sobrepor crenças ao conhecimento, opiniões pessoais aos valores humanitários. Mas viver em sociedade exige mais do que fé ou convicção: exige empatia, exige compromisso com o bem comum. Não podemos continuar a confundir liberdade com imposição, nem identidade com intolerância.

Não tem de ser uma guerra entre “woke” e “radicais”. Aliás, usamos esses termos com uma facilidade assustadora, sem sequer sabermos o que significam. Reduzimos pessoas a caricaturas ideológicas, ignorando contextos, histórias, complexidades. E nesse processo, perdemos a capacidade de pensar por nós próprios.

Consumimos demasiado lixo — mediático, digital, ideológico. Repetimos frases feitas, partilhamos indignações fabricadas, e esquecemos de escutar. O mundo está a ser governado por influencers, não por quem se entrega a uma causa com genuína preocupação pelo outro. A lógica do clique venceu a lógica da empatia.

Charlie Kirk foi uma figura controversa, sim. Mas a sua morte não devia ser usada como combustível para mais uma batalha estéril. Devia ser um alerta. Um convite à pausa. À escuta. À reconstrução de pontes. Porque se continuarmos a escolher o ruído, a ignorância e o ódio, estaremos a condenar-nos — mais uma vez — a repetir os capítulos mais sombrios da nossa história.

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