Os ciclos eleitorais em tempo normal têm o mérito de fazer mexer com o eleitorado. Obrigam a fazer balanços, a comparar promessas, a ler programas. No fundo, são momentos que levam os eleitores a deitar contas à vida.
Mas isso é numa situação normal, com todas as eleições no tempo certo. Não é o que acontece agora.
Por estes dias, voltamos a mais do mesmo. A mais uma campanha, a mais promessas, a mais cartazes e listas e candidatos.
Faz parte do jogo democrático. Mas torna-se enfadonho quando os eleitores são constantemente abordados nas ruas, quando as rotundas se enchem de cartazes, quando as máquinas de fazer propaganda nem desligam o motor e imprimem ideias como quem apanha cerejas em ano de muita fartura e pouco gosto.
E aqui estão os madeirenses – e todos os portugueses – perante um novo compromisso eleitoral. Desta vez são eleições autárquicas, aquelas que mexem claramente com os temas mais básicos da vida dos cidadãos.
Mas este ciclo de eleições em que mergulhámos não ajuda. Desde 2021, ano em que escolhemos os atuais autarcas, os madeirenses já foram chamados a votar por mais sete vezes!
Houve eleições presidenciais em janeiro de 2021.
Autárquicas em setembro de 2021.
Legislativas nacionais em janeiro de 2022.
Legislativas regionais em setembro de 2023.
Legislativas regionais em maio de 2024.
Europeias em junho de 2024.
Legislativas regionais em março de 2025.
Legislativas nacionais em maio de 2025
Seguem-se as autárquicas, em outubro.
E em janeiro regressam as presidenciais com a previsível primeira de duas voltas.
Tão apertado calendário eleitoral mostra uma democracia ativa, mas cansativa. Misturam-se os discursos, repetem-se os candidatos, baralham-se as competências, atrapalham-se as promessas.
Perde-se o interesse.
Confundidos por máquinas de fazer propaganda, muitos eleitores manifestam sinais de afastamento. De retração. De desconfiança. Aceitam os papelinhos, pedem as esferográficas, chegam-se à frente para as camisolas. Mas não querem saber de discursos, não contrapõem, não argumentam.
Os eleitores modernos dizem que sim a tudo. Tanto sorriem para um disparate de um candidato como para uma ideia assertiva de outro. Tanto validam um compromisso inovador, como aplaudem um conjunto de banalidades. Estão noutra onda.
Os eleitores estão noutra!
À primeira vista, este desinteresse é encarado pelos partidos tradicionais como um terreno promissor. Eleitor que não contesta é eleitor satisfeito, pensam eles.
E pensam mal.
Como se tem visto, eleitor que não se manifesta faz parte dos descrentes. Daquele grande grupo que já não acredita, que não vai em cantigas, que sorri para fora e remói para dentro.
Mas vota!
Chegados ao dia das eleições, votam quase sempre os mesmos, com as habituais oscilações. Só que votam diferente e isso está mais do que provado nos resultados eleitorais e vai voltar a acontecer no próximo dia 12.
Cansados de promessas por cumprir, de ideias que não saíram do papel, de truques que alguns eleitos usam para passar culpas, os eleitores deixam-se levar pelos discursos mais incisivos, mesmo que mais mentirosos. Aderem aos extremos, apreciam os populismos, dispersam votos.
E ficam a ver a banda passar.
Os partidos fundadores da democracia que conhecemos assistem a este despovoamento eleitoral como os carros velhos num desfile de clássicos. Deixam-se estar, inertes, em exposição. Até são vistos. Alguns modelos ainda são admirados. Mas ninguém os ‘compra’, ninguém os leva e cada vez menos os querem.