Educação Sexual: Saúde e Igualdade em retrocesso?

O futuro da educação sexual nas escolas portuguesas foi, recentemente, alvo de um debate acesso, originado pela proposta de reformulação das “Aprendizagens Essenciais” da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, e que tem por base a redução explícita de referências à sexualidade, à identidade de género e à saúde reprodutiva nos currículos. Apesar da garantia por parte do proponente de que estes temas continuarão a ser abordados de forma transversal, a verdade é que a sua omissão levanta dúvidas legítimas sobre o compromisso do Estado para com a promoção de uma sexualidade informada, segura e saudável entre os jovens.

Para os leitores menos atentos a esta matéria, a educação sexual não se restringe a uma abordagem acerca do funcionamento dos órgãos reprodutores ou ao uso do preservativo. Trata-se de trabalhar com os jovens – numa sociedade onde grassa a amoralidade coletiva -, temas como: o consentimento, o respeito, os direitos humanos, o combate à homofobia, a construção de relações saudáveis e a autonomia na tomada de decisões.

Diluir a educação sexual no contexto escolar é, à luz da evidência nacional e internacional, um erro com custos sociais e humanos extremamente elevados que o país pagará no futuro. A Organização Mundial da Saúde e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura têm divulgado dados de vários estudos nacionais que mostram um aumento de infeções sexualmente transmissíveis entre adolescentes, a diminuição da utilização de métodos contracetivos, e uma preocupante incapacidade dos jovens em reconhecer a violência no namoro.

A União de Mulheres Alternativa e Resposta, por exemplo, apresentou recentemente um estudo que demonstra que cerca de 75 % dos jovens não identificam como ‘violência’ os comportamentos psicológicos ou verbais abusivos nas relações amorosas.

Face à realidade nacional e ao volume de casos que têm vindo a ser tornados públicos, o importante seria estarmos a discutir estratégias de reforçar a educação sexual, numa vertente verdadeiramente multidisciplinar e alicerçada em direitos fundamentais e não o oposto. Deveríamos estar a concertar estratégias para envolver ainda mais os enfermeiros de saúde escolar, os psicólogos e outros técnicos especializados, valorizando a formação dos professores nesta área, garantindo que todos os profissionais envolvidos dispõem de ferramentas pedagógicas, éticas e científicas adequadas para construir uma resposta eficaz, estruturada e adaptada à realidade.

O artigo de Carmen Garcia, recentemente publicado no jornal Público, expõe com lucidez uma verdade inquietante: substituir conteúdos estruturados de educação sexual por abordagens vagas no âmbito da educação para a saúde representa um retrocesso inaceitável, que fragiliza os jovens, deixando-os vulneráveis à desinformação digital e a discursos discriminatórios e sexistas.

Em pleno século XXI, Portugal enfrenta um sério risco de retrocesso em matéria de educação sexual em contexto escolar – um dos principais instrumentos de promoção da saúde pública, da igualdade de género e da prevenção da violência. Num país que se quer moderno, justo e inclusivo, a educação sexual não pode ser esvaziada, nem deve ser apagada!

Quando educamos para a sexualidade estamos a educar para a liberdade e, acima de tudo, para o respeito e para a dignidade humana. Renunciar a esta missão é trair os compromissos assumidos para com as gerações mais novas comprometendo, deste forma, o futuro das políticas públicas de saúde sexual e reprodutiva em Portugal.

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