Estamos contaminados pela misoginia, na internet, nas ruas, no trabalho, nas escolas, na política… Os séculos da humanidade já vão longos, mas os comportamentos medievos e anti-democráticos renascem e com força. Sim, não há democracia nem avanço civilizacional com a misoginia que lamentavelmente ganha força mesmo entre as camadas mais jovens e para quem nem figuras públicas de relevo são exemplo, sejam políticos ou de outras áreas.
Num país das Três Marias, do seu legado de Novas Cartas, de uma CRP progressista, reemerge um conservadorismo que se limitaria a bacoco não fosse este um atentado à democracia e inaceitável num Estado de direito democrático. Enfileiram-se uns quantos (homens) numa linha de masculinidade hegemónica (e simplória) para se sobreporem e dominarem as livres escolhas das mulheres, criticando-as, humilhando-as e ofendendo-as mesmo em lugares do espaço público, mesmo em tribunas políticas (pouco) democráticas.
Alegam com argumentos vindos de um qualquer submundo intelectual onde prima o direito à misoginia porque vinga a liberdade de expressão – Misoginia não é Liberdade de expressão! É a sua antítese e distorce-a, fragiliza-a. Misoginia é agressão, é violência contra as mulheres! Mas elucida bem, no mínimo, a limitação de vocabulário dos seus emissores que se escudam ridiculamente em “dicionários” para justificar o injustificável, querendo por esta via normalizar o que não pode ser normalizado em democracia: a ofensa, o insulto, a agressão. E relativizar estas ações e comportamentos é ser cúmplice. É legitimar o desrespeito e desprezo contra todas as mulheres, disseminando ideais que agravam a desigualdade e a discriminação de género, e que propagam o ódio.
De notar que o discurso misógino nem sempre vem declarado de agressão, muitas vezes vem a galope do “humor” e, claro, da “esta é a minha opinião pessoal”, da “esta é a minha liberdade de expressão”, mas configura igualmente, e sem atenuantes, violência contra as mulheres com consequências nefastas em toda a sociedade. E tem de ser combatida e jamais normalizada!
Qualquer discurso de ódio, onde se inclui a misoginia, é um atentado aos direitos das mulheres, aos direitos humanos!, e normalizá-los é cimentar uma sociedade desigual e profundamente injusta.
E este trabalho de desconstrução do discurso e comportamento de ódio tem de ser feito nas famílias, nas escolas, nas instituições de justiça e defesa, na comunicação social, nas redes sociais, e sobretudo na política, legislando e modelando bons exemplos de civismo, cidadania, estadismo e democracia. E também por cada um de nós, individualmente, por via da sensibilização do próximo, mas também da denúncia, para que o ódio perca força e seja debelado, deixando de gotejar sexismo, machismo, sectarismo, desigualdades e discriminações entre nós.