No momento em que escrevo este artigo, o céu está carregado e o mundo, em sobressalto. Os Estados Unidos da América, que deveriam estar a negociar com o Irão, entraram de armas e bagagens no conflito entre Israel e o Irão. Numa altura em que se exigia prudência e coragem negocial, o barulho das bombas abafa qualquer voz de razão — e, com Trump novamente ao leme, a diplomacia internacional anda à deriva.
Enquanto isso, do outro lado, Gaza continua a morrer. Já não se trata apenas de uma crise humanitária; é uma nódoa na consciência coletiva da humanidade. Mais de 50 mil palestinianos mortos, lares destruídos, crianças amputadas, hospitais transformados em escombros, colunas de ajuda humanitária bombardeadas, famílias dizimadas. Um povo encurralado entre dois horrores: o terror e a fome.
Gaza é hoje uma ferida aberta na nossa humanidade. E Netanyahu? Prossegue impune a sua cruzada de aniquilação de um povo inteiro, lembrando-nos dos tempos em que juramos “nunca mais”. Não há tréguas, não há corredores humanitários seguros e a compaixão há muito que se extinguiu daquela região.
O governo de Israel, em nome do combate ao terrorismo, perpetua uma destruição cega e indiscriminada. Fala de terroristas escondidos, mas são os hospitais que colapsam, os equipamentos médicos que desaparecem, os abrigos civis que são reduzidos a pó e as famílias que são desfeitas. Gaza tornou-se um lugar onde até nos corredores para receber ajuda humanitária os palestinianos são baleados.
E o mundo? Oscila entre a hesitação e a cumplicidade. A União Europeia publicou recentemente um relatório a apontar “indícios de graves falhas” no respeito pelo direito internacional por parte de Israel. O Serviço Europeu para a Ação Externa concluiu que Israel está a violar o Artigo 2.º do Acordo de Associação UE-Israel, que exige o respeito pelos direitos humanos. E o resultado? Porque é que ainda não foi suspenso o acordo? A União Europeia tem não só a obrigação moral, como a responsabilidade política de se posicionar com firmeza. Não chega constatar violações, é preciso agir. É urgente garantir que a ajuda humanitária chegue a quem já perdeu tudo. Que os comboios com alimentos e medicamentos não sejam alvos militares, mas faróis de vida. Que o direito internacional não seja apenas retórica, mas prática.
A diplomacia não pode servir apenas para negociar entre potências. Deve, acima de tudo, proteger os que não têm voz, nem aliados, nem defesa. Como recordou e bem António Guterres: “Mesmo as guerras têm regras.” E há um momento em que o silêncio é cúmplice.