O País está chocado. O Elevador da Glória, em Lisboa, despenhou-se contra um prédio levando a vida de 16 pessoas e deixando feridos outras tantas, algumas das quais com mazelas graves. Tudo indica que um cabo partiu e deixou de ser possível controlar aquele trem que, na inclinação, adquiriu uma velocidade incompatível com o carrilamento. Tecnicamente aguardam-se explicações e análise de causas.
O trágico acontecimento suscitou-me duas reflexões: uma reativa e outra de substância!
Nos primeiros momentos, assistiu-se a uma consternação geral das mais variadas entidades entre as quais os políticos portugueses. Houve lamento e condolências. Outros acrescentaram que seria bom apurar causas e que até lá tudo o mais era prematuro. Esse período foi, porém, efémero. Condizendo com a época pré-eleitoral, saltaram vozes a requerer demissões e julgamento políticos imediatos.
Alguns relembraram o que aconteceu em 2021 quando Medina era Presidente da Câmara de Lisboa e houve partilha de dados pessoais pelos serviços municipais de três organizadores de uma manifestação anti-Putin com a embaixada russa em Lisboa e o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia. Querendo equiparar um ato deliberado e assumido de prestação de informação de dados com uma rutura de um cabo que garantia a elevação controlada de um elétrico, pedem a demissão do atual Presidente de Câmara quando esses arautos, há quatro anos, recusaram idêntica atitude.
É evidente que é um aproveitamento político que parece vir a ser fundamento de uma moção de censura à Câmara de Lisboa (de todo o executivo já que as moções só podem ter esse fundamento!) para que caia um Presidente que se recandidata em outubro. É um aproveitamento que além de ser em cima da “ferida que ainda sangra” nos parece totalmente desadequado e desproporcional. Carlos Moedas (como tantos outros) teve um comportamento irrepreensível perante uma tragédia que obviamente nada teve a ver com a sua vontade e até com a sua “responsabilidade política, técnica e objetiva”. Diferente seria se não houvesse manutenção e reparação periódica ao equipamento! Diferente seria se tivesse dado instruções à Carris para não efetuar a manutenção, ou se não a financiasse para esse efeito! Diferente seria se tivesse havido previamente sinais de que o cabo ou a estabilidade do elevador estaria em causa. Nada disse veio a público que pudesse suscitar responsabilidade funcional ou política!
A outra reflexão que partilho não é de ordem política e assalta-me sempre nestes acontecimentos! Como nos choca tanto a morte! Ainda mais quando ela é inesperada, abrupta, violenta. Dificilmente aceitamos a fragilidade da vida e não raras vezes reputamos a uma injustiça divina. Mais ainda quando vimos atingir crianças ou pessoas a quem se podia almejar muitos mais anos de vida. A nossa consternação (e revolta?) tem, porém, uma causa de que raras vezes falamos: o desejo de eternidade. Nasce com o homem e manifesta-se ao longo da vida. Queremos que não acabe a nossa vida terrena e aceitamos mal o decesso.
Não será isso um forte indício de que há uma eternidade que nos espera depois deste adeus terreno que tantos nos custa?
Ricardo Vieira escreve ao domingo, de 4 em 4 semanas.