AS: normalmente acabo com um PS, mas desta vez é ao contrário. Fica então aqui uma espécie de “Ant Scriptum”. Se são sensíveis, não leiam mais. Não leiam! Leram bem? NÃO LEIAM. Depois não vale a pena irem para a caixa de comentários chamar-me “mostro” e dizer que “tamém devia merrer”. Ok? É que depois eu não consigo acompanhar o raciocínio em línguas estrangeiras. Vá.
Então, esta semana aconteceu mais uma tragédia. Em plena hora de ponta, de quarta-feira, o Ascensor da Glória descarrilou. Pouco passava das 18 horas quando o funicular que liga a Baixa de Lisboa (Praça dos Restauradores) ao Bairro Alto nuns íngremes 275 metros percorridos durante pouco mais do que três minutos, desceu em poucos segundos. Sim, veio por ali abaixo, desgovernado, varrendo tudo o que apanhou pela frente. Assim que soube da triste notícia, só me veio à cabeça a mesma pergunta que me faço sempre que acontece um acidente. Estaria, entre as vítimas, algum português?
Em junho, por exemplo, caiu um avião na Índia. E eu temi logo o pior. Pressenti logo que poderíamos ter perdido alguns dos nossos. É que morreram quase todos, todos, todos. Só se salvou um. Das 241 mortes, 169 eram indianos, 53 britânicos e 1 canadiano. O resto? Qual sexto sentido, qual quê?! Portugueses, claro. Curiosamente nenhum dos nossos compatriotas tinha cá família. Os Aditya’s, Ravi’s, Anik’s, Dev’s e afins eram tão portugueses como eu sou indiano, mas pronto… Para os devidos efeitos eram portugueses de corpo e alma. Bem, nesse momento já eram só de corpo. Ou só de alma? Olhem, não sei. Eram portugueses e ponto final.
Só que, desta feita, ainda tive esperança que nos pudéssemos ter safado todos. Quer queiram, quer não, Lisboa é um sítio que já é pouco frequentado por tugas. Lá, a muito custo, ainda se encontra um ou outro. Mas não é fácil. Daí o meu optimismo. Inicialmente falou-se num morto e vários feridos! Nada mau. De repente já eram 15 os que tinham perdido a vida. Mau mau. Contaram bem? No dia seguinte actualizaram para 17. No meio disso tudo, uma criança francesa (nessa altura era francesa) tinha sido resgatada dos escombros, a mãe estava em estado crítico e o pai era um dos malogrados. Pouco depois, nova actualização: 16 mortos. Não, ninguém ressuscitou que isso é coisa só para Cristo. Afinal de contas, o pai do menino alemão (agora parece que já é alemão) estava vivo! Aleluia aleluia. A família, essa, que já se tinha posto a caminho e ido ao Instituto de Medicina Legal reconhecer o cadáver, mas não se identificou com nenhum, respirou de alívio. Mas isto não se faz. É muito mau! Até já me faz lembrar aquele tipo que estava na tropa quando o seu irmão morreu. Uma vez que era um recruta muito nervoso, não sabiam como dar a notícia sem que ele tivesse um piripaque. O General, prático e conciso, chamou-o e disse: “tenho uma boa e uma má notícia para te dar. A má é que a tua família toda morreu”. Pálido, quase a ter um baque, o rapaz pergunta: “e a boa?”. “A boa é que em parte é mentira e foi só o teu irmão”. “Ufa, que alívio”. Assim deviam ter pensado os avós do rapaz franco-alemão.
Adiante e resumindo, até agora e ao que se sabe, são 16 mortos. Mas vale o que vale. Fala-se em 2 sul-coreanos, um suíço, três britânicos, dois canadianos, um ucraniano, um americano e um francês. Os outros cinco, infelizmente, são portugueses. É verdade. Por incrível que pareça… Aposto que era o guarda freios, o pica bilhetes e 3 carteiristas. Ah não. Esqueçam. Esses já nem de cá são. Até disso vem de fora. São romenos, parece. Afinal eram funcionários da Santa Casa que estavam no sítio certo à hora errada. Enfim… Uma tristeza! E aposto que ninguém previa. É que perder a vida na carreira 148 do Siga, eu ainda entendo… Meter-se no autocarro que liga o Funchal à Boa Morte é não ter amor à vida. Mas agora no Elevador da Glória?!? Bolas. Ninguém merece.
O que ninguém merece também é o que passou uma cidadã brasileira de 30 anos, que vive e trabalha em Lisboa. Então não é que a senhora vinha de França num voo da TAP e este foi cancelado?! Ok, até aqui nada de novo, eu sei. É só mais um dia normal. Mas o pior estava por vir. É que, chegada ao hotel, foi acomodada num quarto com um conterrâneo seu que estava nas mesmas condições. Conclusão? Acabou, segundo a própria, quase violada. Quase, quase. Qua-se.
É assim, eu não sou advogado de defesa de ninguém. Muito menos da TAP. Admito que a empresa atravessa alguma turbulência e já teve melhores dias, mas também não é justo ter que se responsabilizar pela incapacidade de descolar de terceiros. Não deu, não deu. Azar. Fica para a próxima.
Pedro Nunes escreve ao domingo, todas as semanas.