Dois agentes da PSP de Olhão foram suspensos de funções e estão acusados de dois crimes de sequestro agravado e de um de homicídio qualificado por terem alegadamente provocado a morte a um cidadão marroquino em março de 2024.
De acordo com a acusação do Ministério Público (MP) relativa ao caso, datada de 18 de julho e a que a Lusa teve hoje acesso, a agressão dos agentes à vítima resultou em lesões que provocaram a sua morte, depois de cerca de 20 dias internado nos Cuidados Intensivos do Hospital de Faro.
Os arguidos, que foram suspensos de funções por ordem judicial e se encontram a aguardar julgamento com Termo de Identidade e Residência, são dois agentes da Esquadra da PSP de Olhão, de 47 e 57 anos, que se encontravam de serviço no dia do crime.
Contactada pela Lusa, fonte da Direção Nacional da PSP confirmou a suspensão de funções dos arguidos e a instauração de dois processos disciplinares, manifestando o seu repúdio por “quaisquer comportamentos que violem a defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos”.
“Face à gravidade dos factos constantes da acusação, a PSP aguarda o julgamento, mantendo os elementos afastados de funções, a fim de, com base na sentença, decidir sobre os desenvolvimentos subsequentes, os quais poderão, inclusivamente, ser definidos no próprio âmbito judicial”, referiu a mesma fonte.
O caso remonta a 09 de março de 2024, quando foi comunicado ao carro patrulha onde se encontravam os arguidos a ocorrência de desacatos num supermercado em Olhão, durante a tarde. No entanto, quando chegaram ao local, Aissa Ait Aissa e Hassan Ait Rahou já lá não se encontravam.
Segundo a acusação, os agentes procuraram-nos e acabaram por encontrá-los noutro local, tendo recolhido imagens e cópia da documentação de Hassan Ait Rahou que um dos arguidos guardou no telemóvel.
No mesmo dia, à noite, os imigrantes voltaram àquele supermercado e “evidenciaram um comportamento muito alterado, em virtude de previamente terem consumido produtos estupefacientes”, tendo começado a abrir embalagens de produtos alimentares e comeram o seu conteúdo dentro da loja.
Interpelados pela funcionária do supermercado, insultaram-na, o que fez com que a encarregada do estabelecimento se deslocasse também junto deles, tendo sido igualmente insultada, lê-se no documento.
Face à confusão que se gerou no interior da loja, uma cliente telefonou diretamente para a polícia, sem passar pela central ou 112, tendo os mesmos agentes, que estavam de serviço no turno entre as 15:30 e as 00:00, ido ao local para tomar conta da ocorrência.
Mais uma vez, à sua chegada, Aissa Ait Aissa e Hassan Ait Rahou já tinham abandonado o supermercado, mas os agentes conseguiram encontrá-los nas imediações da loja, tendo-os encostado ao carro patrulha e algemado com as mãos atrás das costas.
A encarregada do supermercado disse aos agentes não querer apresentar queixa, mas, mesmo assim, os dois agentes colocaram os homens no banco de trás do carro da PSP, detendo-os sem os levar para a esquadra ou elaborar qualquer expediente.
De acordo com a acusação, os arguidos seguiram depois em direção a Pechão, próximo de Olhão mas fora da sua zona de patrulhamento, e pararam o carro num caminho municipal, tendo atirado Hassan Ait Rahou, que entretanto adormecera, para a berma da estrada, e retirado Aissa Ait Aissa do carro.
“Quando se encontrava fora da viatura, devido a motivos não apurados, os arguidos, atuando concertadamente, desferiram várias pancadas na cabeça e face de Aissa Ait Aissa”, tendo, pelo menos uma das pancadas sido desferida com um objeto, lê-se na acusação.
Aissa Ait Aissa, que segundo o MP não se conseguiu defender, pois estava algemado, viria a morrer por contusão encefálica, como resultado das agressões, em 28 de março, cerca de 20 dias após o crime.
O MP considera, ainda, que os agentes “agiram livre e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas pela lei penal” e “abusaram gravemente” da sua autoridade, sabendo que seria possível, com o seu comportamento, poder causar a morte à vítima.