Se há previsibilidade infalível no nosso País é a que nos anuncia, com larga antecedência, que vamos ter incêndios no verão.
É certo que as alterações climáticas baralharam as estações do ano, mas podemos ter como garantido que quando chegar o calor, vem também uma onda de incêndios.
E depois, dias depois, chegam os discursos ocos de políticos insensíveis a fingir que estão ‘a fazer coisas’ para remediar o que para eles – e só para eles – foi uma completa surpresa. “Que estranho, um grande incêndio em pleno mês de agosto?!”
Tem sido assim o nosso fado dos fogos de verão.
Mas, este ano, o primeiro-ministro introduziu um elemento com tanto de novo como de impensável e desastroso: completamente deslocado – sem ofensa à cantiga dos NAPA – Luís Montenegro foi na mesma à festa do Pontal e subiu ao palco para o habitual discurso político.
E enquanto centenas ou milhares de portugueses fugiam das chamas e tentavam salvar o que podiam, o primeiro-ministro falava de “excedente orçamental”, de investimento, de impostos… e prometia que Portugal vai voltar a ter Fórmula 1.
Foi assim mesmo, como se a prioridade do momento fossem números políticos e provas desportivas.
Desta forma, Portugal retoma a política dos 3 F. Só que em vez de Fado, Futebol e Fátima, temos agora Fado, Fogo e Fórmula 1.
Na verdade, o que fez Montenegro – e outros que o antecederam – foi revelar uma tremenda insensibilidade e ausência de previsibilidade.
É evidente que ninguém sabe quando e onde começa um incêndio. Mas parece razoável pensar que deve haver planeamento mínimo para reunir meios necessários ou pedir ajuda externa em tempo útil. E aí voltámos a falhar.
Parece que não aprendemos nada.
Depois do mal feito, aparecem as tentativas de recuperar terreno. Entram em campo os estrategas e o primeiro-ministro interrompe as férias para coordenar o que já não tem coordenação possível. E voltamos a reagir e a fazer o melhor que podemos com centenas de bombeiros exaustos à espera que o calor abrande e que chegue a ajuda europeia.
Todos os anos é isto. Repetem-se as imagens cruéis de gente que fica sem nada, de labaredas a rodear casarios, de bombeiros cansados, de voluntários de balde e mangueira, de animais em fuga. E de políticos a fingir que ‘fazem coisas’.
Por cá, felizmente, não temos grandes razões de queixa.
Até agora têm funcionado com prontidão os mecanismos de prevenção e combate e os mais de 100 alertas registados desde junho foram rapidamente resolvidos com os meios disponíveis na Região. Sobretudo o meio aéreo, que tanto tem feito para evitar males maiores. Oxalá assim continue.
E é nesta altura que nos lembramos como fomos completa e redondamente enganados durante anos por figuras que juravam que não se podia usar meios aéreos na Madeira. Justificavam com palpites improvisados sobre os declives e as montanhas. Garantiam que a água viria encosta abaixo e levaria pessoas, casas e outros bens à frente. Asseguravam que seria uma desgraça.
Hoje, passadas não mais de duas décadas, a experiência mostra exatamente o contrário. O meio aéreo é absolutamente necessário e determinante no primeiro momento de combate ao fogo.