Eis o Governo que nós temos. Um Governo “amigo das famílias”, dizem eles. Um Governo que quer impedir que pais recusem trabalho no turno da noite ou ao fim de semana; que pretende que as mulheres apresentem atestado de seis em seis meses para usufruir de licença de amamentação; que pretende ainda eliminar a falta por luto gestacional.
Enquanto mulher e mãe de três filhos, não podia deixar de escrever na crónica de hoje sobre este tema, focando na questão da dispensa de amamentação.
Partilho aqui a minha experiência pessoal.
Após meses de licença de maternidade, eis que chega o dia de regresso ao trabalho. É sempre aquele friozinho na barriga, de regressar à rotina laboral e, ao mesmo tempo, ficar horas distante do nosso recém bebé.
Solicitei dispensa de amamentação e sempre foi bem aceite pela minha entidade patronal, sendo que o horário era acordado em meu benefício e da própria empresa. Neste ponto, não tenho nada a apontar. Contudo, e apesar do apoio incondicional que recebi dos meus superiores hierárquicos, notei aquela represália por parte das colegas – mulheres – que consideravam injusto eu não trabalhar as mesmas oito horas que elas. Ouvi comentários e sussurros por usufruir de um horário reduzido, do género “Como é que contratam alguém com um bebé tão pequeno para este trabalho? Alguém com filhos pequeninos não devia trabalhar aqui.” Por momentos, sentia-me triste e em baixo quando ouvia este tipo de comentários, principalmente, vindo de mulheres (colegas). Mas isto só fazia com que eu ficasse mais forte, sentido necessidade de provar a mim mesma e a todos de que NUNCA iria baixar os braços e que merecia o cargo que exercia.
Tal como eu, existem vários outros casos e até bem piores que o meu, de mulheres que sofrem uma pressão e até discriminação por usufruirem de licença de amamentação, ao ponto de abdicarem deste direito! O que deveria escandalizar não é uma mãe ter duas horas por dia para amamentar um filho, mas sim o número crescente de mulheres que são despedidas durante a gravidez, o pós-parto ou a licença de maternidade.
Meus amigos, a licença de amamentação é um DIREITO! Sim, é fundamental garantir que a parentalidade não penalize as carreiras das mulheres. Mas a solução não pode ser forçar a mãe a abdicar do tempo que tem com o seu bebé, para que a balança laboral se equilibre. Isso é violência, não só contra as mulheres, como também contra os bebés.
Temos até uma ministra – mais uma vez, uma mulher – que insinua o uso abusivo de horário de amamentação. Esquecem-se de um pequeno pormenor: o horário de amamentação não é apenas para amamentar um bebé. É sim para manter aquela ligação entre a mãe e o bebé que é criado, o mimo, a conexão, a proximidade, o cuidado, a relação humana.
Provavelmente, a Senhora Ministra desconhece o que é abuso. Abuso é questionar, numa entrevista de trabalho, se esta tem filhos. Abuso é uma mulher não ser promovida por ter filhos. Abuso é não haver prémios porque se esteve de licença ou de baixa. Abuso é a pressão que existe para se abdicar de direitos parentais.
Estas medidas só promovem desconfiança e stress desnecessário.
O que deveríamos estar a discutir? Talvez licenças mais longas ou políticas laborais que não castiguem a maternidade. Opções alternativas de modo a ser possível conciliar a maternidade com a carreira profissional, como horários reduzidos, teletrabalho, locais de coworking com rede de apoio para os bebés… sejamos criativos!