Mãe olha à janela que eu ´tou a chegar

“Mãe olha à janela que eu ´tou a chegar”, foi das últimas frases cantadas que ouvi e que dizem muito de um sentimento profundo e de bem-estar que é o Amor.

Neste caso o amor pela família, pela sua terra e algo mais. E é esse – algo mais – que torna a frase tão simples, como genial, porque leva-nos para muitos lugares e estados de espírito, como também fica na memória.

Faz lembrar os bons filmes de suspense, que por não serem demasiado explícitos, indicam um caminho e a nossa mente individualmente faz o resto. Cada um idealiza o resto da cena.

Confesso que foi uma lufada de ar fresco, especialmente nos tempos individualistas e impessoais que vivemos.

Tempos estes, que quase dão razão a Platão, em que o amor existe de uma forma Platónica, ou seja, com a busca da admiração por alguém, perfeita, inatingível e sem desejo físico. Um tipo de amor que é “fogo no capim”, na artificialidade das redes sociais e nas – vidas perfeitas mediáticas – dos nossos tempos.

Hoje em dia, pelo menos até ver, teoricamente ainda existem várias manifestações de amor, nomeadamente, o amor entre pais e filhos, o amor entre casais e até o amor próprio.

O amor entre pais e filhos, apesar de algumas exceções, e sendo Portugal ainda um país com um sentimento forte de família, não estará tão em crise. Mas este tipo de amor pode ser excessivo ou obsessivo, em relação a um filho ou a uma filha e impeditivo de cada um seguir com a sua vida.

Quanto à dimensão do amor próprio, é algo muito importante para a autoestima e confiança de cada indivíduo, para gostarmos de alguém temos de gostar de nós próprios. Este amor próprio levado ao extremo, pode também ser prejudicial para as outras formas de amar, especialmente na sua vertente egocêntrica e narcisista, que infelizmente, veio para ficar e parece ser o novo normal entre as pessoas com mais poder.

O amor entre casais, é que na minha opinião já viveu melhores dias.

Os tribunais estão inundados com processos de divórcio, responsabilidades parentais, violência doméstica, a conflitualidade está instalada e veio para ficar.

Talvez por isso e não só, costumo dizer que um dos grandes desafios da nossa geração são os relacionamentos pessoais.

Isto porque, que com as solicitações, expetativas e exigências do nosso dia-a-dia, deixamos de ter a capacidade de amar.

Porque o amor exige compromisso, atenção, cuidado, carinho, respeito, dar sem receber, mas também exige sofrimento, e por vezes sofrimento profundo. O que não dá muito jeito, num mundo que é cada vez mais rápido, instável e intenso.

O que hoje é, amanhã já não é, habituem-se. E a continuar assim, o que é de manhã, de tarde já não é.

Estamos a viver demasiado uma única vida, esquecendo que a vida é única.

A saturação numa relação acontece quando as relações de troca e satisfação se desequilibram.

Por vezes, o amor entre casais só se manifesta com o sentimento de perda, o que nos leva para a dimensão do António Variações em que “só estou bem onde não estou”, e a busca da felicidade é um conflito interior, em que eramos felizes e não nos apercebemos quando o fomos.

O amor é simples, nós é que complicamos. Amor é quando os bons momentos superam os maus momentos, é quando estamos exatamente onde queremos estar, é compartilhar sonhos, ideais e valores, é ter qualidade de vida a dois, é arranjar tempo um para o outro e sobretudo querer envelhecer juntos.

E não devemos ficar velhos, antes de ficarmos sábios, especialmente na nossa capacidade de amar.

Por isso, e sem dar a devida vénia a Platão pelo seu pensamento, tenho que concordar com o primeiro cantor português que ganhou o Festival, quando diz que “Não se ama sozinho”.

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