Ordem dos Médicos critica exigência de atestado para amamentação e alerta para retrocesso

As alterações constam de um anteprojeto de reforma da legislação laboral aprovado em Conselho de Ministros.

A Ordem dos Médicos (OM) criticou hoje a exigência de um atestado no início da amamentação, proposta pelo Governo, alertando ser um retrocesso legal que privilegia a produtividade em detrimento da infância e promove ‘stress’ desnecessário às mães.

A posição do Colégio de Medicina Geral e Familiar da OM surge em reação às alterações à dispensa de amamentação que o Governo pretende implementar.

As alterações constam de um anteprojeto de reforma da legislação laboral aprovado em Conselho de Ministros e apresentado aos parceiros sociais na semana passada e divulgado hoje pelo Jornal de Notícias.

O jornal adianta que as mães que queiram ficar em casa para amamentar terão de apresentar um atestado médico à entidade empregadora, logo no início da dispensa, ficando obrigadas a fazer prova a cada seis meses. A legislação atual só prevê a prova a partir do primeiro ano do bebé.

As mudanças na legislação laboral definem também que o direito a faltar ao trabalho para as mães que amamentam só é válido “até a criança perfazer dois anos”, uma limitação que não existe na lei atual.

Em declarações à agência Lusa, Deolinda Almeida, da direção do Colégio de Medicina Geral e Familiar, criticou a exigência de um atestado médico e alertou que “não se pode olhar para os médicos como uns ‘carimbadores’ de legitimidade”.

Defendeu que a proposta do Governo devia criar medidas universais e não discriminatórias: “Em vez de exigir provas, de criar exceções, uma proposta (…) mais equitativa seria uma redução universal do horário nos primeiros dois anos de vida para todas as crianças e sem necessidade de justificar a forma de alimentação”.

Deolinda Almeida disse que o Colégio de Medicina Geral e Familiar emitiu um parecer, em março de 2024, sobre a “emissão de atestados de amamentação para além de um ano de idade”, na sequência de um pedido.

O parecer defende que “a redução do horário laboral para as mães durante o período de amamentação deve ser uma norma generalizada até aos dois anos de idade da criança” e que a verificação desse compromisso deve ser feita através de “uma declaração de compromisso de honra por parte da mãe” e não por atestado médico.

Explicou que esta posição se deve ao facto de a OM acreditar que “mais do que caminhar no sentido da produção, a sociedade deve caminhar para a humanização”.

“Neste momento, estamos a assistir a um retrocesso. Estamos a legislar como se o tempo fosse apenas uma questão de produtividade e a esquecer que a infância não é recuperável”, alertou.

A vogal do Conselho Nacional da OM avisou ainda que “aumentar as burocracias”, pedir “mais um papel”, numa altura em que “a família está tão frágil, a adaptar-se a um novo elemento”, são “fatores criadores de ‘stress’ desnecessário”.

“A mulher está frágil, o bebé também acabou de chegar, e é necessário criar um vínculo e estamos a criar entraves a esse vínculo que deveria ser apoiado e fomentado na sociedade”, em que cada vez “é mais difícil”, sobretudo as mulheres, conciliarem a vida familiar com o trabalho.

“Quando regressamos da licença de maternidade, muitas vezes sentimos que estamos a falhar em todas as frentes. Estamos no trabalho a pensar no nosso bebé, estamos em casa a pensar no trabalho que ficou por fazer. E este ónus deveria ser retirado de cima das mulheres e independentemente da amamentação, que tem todo o benefício”, defendeu.

A médica salientou que, mesmo as mulheres que não amamentam, deveriam ter direito a usufruir do tempo de criação de vínculo com os seus bebés, “tal como esses bebés também têm direito a usufruir do vínculo com as suas mães”.

No seu entender, devem ser incentivados modelos laborais que sejam recentrados no bem-estar da família e que exijam mecanismos de substituição destas mães e da sua redução para a responsabilidade laboral não cair sobre elas.

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