Debruçados em agosto, pensamos férias e, só de pensar, abrandamos o ritmo e permitimo-nos descansar o nosso olhar naquilo que não nos é permitido viver o resto do ano: o vagar.
Se olharmos para trás e nos encontrarmos connosco, num tempo-outro em que havia tempo, vemo-nos sentados à beira-mar, a fazer um esforço enorme para não continuarmos dentro do mar, a sentir o sol na pele crestada de sal, voltamos a sentir o cheiro do pão com manteiga derretida de calor e o sumo das ameixas a escorrer, doce e peganhento por entre os dedos salgados; vemo-nos, nas tardes, sentados debaixo das latadas, lendo os livros que íamos requisitar à biblioteca, reinventando, com os amigos, as aventuras do Cinco e dos Sete; acompanhando (tantas vezes, em silêncio), deitados no chão, as nuvens que faziam desenhos no céu.
Hoje, pensando em quem fomos e na vida que construímos, temos saudades da inocência, dos amigos, desse tempo sem tempo que nos foi dado viver.
Vivemos, sim, meus amigos. Vivemos muito. Bem ou mal, fomos tecendo os nossos dias, como quem borda, fazendo e refazendo o bordado, encontrando sentidos em cada ponto, acendendo a luz, ao cair das noites. Percebemos que se não nos levantarmos para o fazer, não podemos reclamar da escuridão.
À beira de agosto, porém, apetece-nos lavar a alma das noites, deixar no mar o que nos impede ser felizes, apreciar a possibilidade de nos deixarmos ficar, contemplar o que temos à nossa frente e não vemos, apreciar a verdadeira razão das coisas e parar. Precisamos de descansar, meus amigos, de limpar os nossos por-dentros de tanto stress, de tantas preocupações, de tanto “ter de ser” que nos consome. Precisamos de olhar a imensidão deste mar que nos assombra e de reequacionar as nossas urgências. Precisamos de recuperar o espaço onde, dantes, guardávamos os sonhos. E de viver.
Boas férias!