Autonomia e responsabilidade

A autonomia é uma palavra atirada tantas vezes que não sei se a sua compreensão é adequada, ou se é compreendida com as ramificações necessárias. Talvez a forma mais fácil será comparar ao processo de crescimento humano. Talvez assim se compreenda que autonomia é responsabilidade, mais do que liberdade. Sim, podemos escolher, mas como plenos Adultos, sabemos que as nossas escolhas têm consequências. Impostos, leis. Temas complexos, mas que são a base da nossa vida em sociedade. Partilha e respeito. Autonomia, como palavra e conceito tem sido utilizada sobretudo para facilitar o domínio e pouco para aumentar a dignidade. É aí que a retórica falha.

Por exemplo, nos últimos dias pude ler nas redes sociais uma manifestação de apoio de forma livre e liberal, bem escrita e digna, para a seguir, pessoas que supostamente conhecem e valorizam a pessoa em questão, atacarem num despique porque se a pessoa é de um partido não pode apoiar outra que está a receber apoio de outro partido. E é neste mundo pequeno em que vivemos. Os partidos são como clubes de futebol e independentemente da boa razão, valores ou mais-valias de uma pessoa, o que interessa é que cor é que veste. E quando o clube não ganha, foram os árbitros que roubaram golos.

Com uma humanidade com esta mentalidade, partilho a minha mais assustadora previsão do futuro. Vamos, no global, aceitar a inteligência artificial como orientadora da nossa vida, da política e do mundo. No futebol, um desporto de muitas emoções e dinheiro, o vídeo-árbitro tem sido cada vez mais importante nas decisões. Em poucos anos vai ser substituído pela inteligência artificial. Vai ser mais rápido, “neutro” e capaz de explicar porque é que tomou determinada decisão. Também na política, vamos fazer o mesmo. Tudo se deve à dificuldade de encontrarmos compromissos nos pontos de vista que temos. De remarmos todos para o mesmo lado, mesmo que nem todos estejamos de acordo. Porque às vezes as melhores decisões não são confortáveis para a maioria, ou para os mais poderosos.

Tudo começou com a subida do voto na extrema-direita. A insatisfação natural de aparente estagnação e suspeitas de corrupção, abre terreno para o discurso manipulatório. São mesmo santos que nos vêm salvar? Com a tomada de poder da extrema-direita, ou a sua influência nos outros partidos para tentarem não perder tantos votos, as medidas vão levar-nos a novos problemas sociais. Se ganharem, vamos ver que são tão corruptíveis como os outros partidos. Quando o grosso perceber que não existe luz ao fim do túnel da corrupção, vão aceitar a inteligência artificial a governar. Vão exigir que assim seja. Talvez entre 5 a 10 anos.

Não sei se ainda vamos a tempo, mas se formos, este é o momento de darmos tudo o que temos como humanidade para sermos capazes de estar à altura de sermos a espécie dominante e autónoma deste planeta. Cuidar do planeta, cuidarmos dos seres vivos que nele habitam e de toda a humanidade. A humanidade não é uma ilha ou um país, somos todos. Somos todos e somos um. Está na hora de passarmos à idade seguinte, à consciência global. E esta forma de vermos o mundo, faz com que cuidemos melhor da nossa parte nele. Está na altura de sermos adultos, escolhermos quem tem valores e não cores. A experiência de quem faz a diferença. Quando regressará a paixão e a força criativa de génios como Almada Negreiros e os corajosos do Orpheu e será renovada esta estagnação social alimentada pela superficialidade das redes sociais?

Daniel Neto escreve à terça-feira, de 2 em 2 semanas.

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