110 decibéis

Hoje, queria escrever sobre poesia. Sobre um novo livro. Mas, numa altura em que tanto se debate a segurança, e a perceção da falta dela, sobretudo em algumas ruas do nosso país, derivei no meu propósito. Todos os dias, somos confrontados com realidades que nos remetem para os dados do último Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), elaborado pelo Sistema de Segurança Interna (SSI). Este foi o documento que revelou uma diminuição da criminalidade geral em 4,6% em Portugal, contrariando a perceção de aumento da insegurança. Apesar desta descida, a criminalidade violenta e grave tinha registado um aumento de 2,6%, com 14.385 casos. A tese de que a criminalidade está a crescer descontroladamente não parece, por isso, numa primeira leitura, digo eu, que não sou especialista nesta matéria, fazer sentido, pelo menos a ter fé nestes números oficiais. Mas, a perceção que se sente, é outra. E deve ser mais debatida. Sem populismos, e sem cairmos na narrativa dos partidos e movimentos de extrema-direita, que crescem dentro e fora do nosso país. O Relatório Anual de Segurança Interna, foi publicado no início do ano. Por essa altura, muito se falou no documento, na sua análise, bem como na situação da segurança interna no país. Os dados estão todos lá, mas a verdade é que todos os dias são relatados novos factos, novas situações, sobretudo nas duas grandes metrópoles, Lisboa e Porto, que não nos afastam da tal perceção de insegurança. Pelo contrário. Muito embora, os especialistas em segurança, nos tentem tranquilizar. Quero acreditar, nos números, de facto. Ninguém consegue viver bem, com medo. Em nenhuma cidade.

A esse propósito, no outro dia, via Instagram, descobri a FlamAid. Desconhecia, por completo as funcionalidades desta granada pacífica. Fiquei impressionada, tanto com a história que esteve na base da sua criação, como na sua mais-valia, em termos de defesa pessoal, para os dias de hoje. Sobretudo nas noites. De qualquer cidade, admito. A FlamAid é um alarme sonoro, com localização GPS integrada, que nasceu numa noite em que Julieta Rueff voltava para casa sozinha. A história deste alarme sonoro, com GPS integrado, cruza-se com o medo que nos faz olhar por cima do ombro, quando se caminha, noite adentro, pelas ruas de qualquer cidade. E em qualquer parte do mundo. E, foi numa dessas noites, em que Julieta Rueff regressava a casa, que percebeu algo que para si tinha ficado muito claro: ninguém deveria viver com medo. Já lá vão três anos, desde então. Em 2022, essa promessa transformou-se na FlamAid.

A FlamAID é uma granada pacífica, compatível com iOS e Android, que é ativada puxando o pino. O que substitui uma explosão, tal como uma granada que é ativada, são os 110 decibéis que liberta, que tornam impossível a presença de quem a ativa, numa qualquer rua, passar despercebida. Com o detonar dos decibéis, é, ao mesmo tempo, sinalizada a localização de quem a detonou. A localização é enviada «para quem realmente importa». É mais ou menos desta forma que a fundadora da FlamAid apresenta este mecanismo de defesa. Para Julieta Rueff, a FlamAid não é apenas um dispositivo. É um propósito. Com a FlamAid, «chegarás a casa. Sempre», podemos ler na sua página.

Pela sua presença, sobretudo no mercado ibérico, e por lhe reconhecer valor, em termos de segurança pessoal, quis partilhar a sua existência. Hoje, queria escrever sobre poesia. Mas, derivei. Deixo aqui aquela que será a minha próxima leitura: Aos que descem a montanha, do Octávio Carmo. A propósito do medo. Este é um convite à coragem de descer. A aceitarmos a queda como parte do voo.

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