Nas últimas décadas houve uma progressiva mudança de “o esforço compensa” para “rápido e fácil”. Em parte, esta mudança foi facilitada pelo markting agressivo de múltiplas empresas. O egoísmo é reforçado para se gastarem montanhas de dinheiro em produtos pouco necessários, criando montanhas de lixo. O que interessa é as pessoas sentirem-se bem com as suas compras e logo a seguir mal, para comprarem novamente. É neste ambiente que é reforçada a noção do “eu”, “eu mereço”, que caminhamos para o outro lado do pêndulo.
O pêndulo da história vai alternando entre momentos de maior liberdade e momentos de grande limitação. Momentos de prosperidade contrapõem-se a momentos de guerras desesperadas e ditadores tirânicos. Infelizmente estes ciclos vão-se alternando, apesar de um grande grupo de pessoas estar mais consciente dos perigos das páginas que se viram, estamos num impasse. A força para o extremismo aumenta a cada mês que passa. A força do bom-senso diminui. E como podemos evitar a viragem que parece inevitável?
Alterando o paradigma do prazer e da responsabilidade. Num ambiente de agrado promovido por empresas e redes sociais, que facilitam o consumismo, precisamos de relembrar a disciplina necessária para a saúde e o altruísmo necessário para a sobrevivência da sociedade. Somos todos responsáveis pelo que aí vem.
A disciplina é o melhor antídoto ao egoísmo do prazer “porque eu mereço”. Mereço relaxar, não fazer nada, comer o prazer de todos os cantos do mundo. É fundamental a disciplina para realizarmos exercício físico de forma regular. De cuidarmos da nossa alimentação de forma saudável. De realizarmos atividades que nos equilibram e nos constroem, como ler, meditar. A cultura superficial atual, com a estética do botox a ser vendida como saúde mental, e tantas outras atividades superficiais, conduzem-nos à paralisia do nosso eu superior. Vivemos agarrados ao nosso lado inferior, do prazer anencefálico e imediatista. É na disciplina que podemos encontrar o prazer esperado, o prazer mais profundo. Toda a procura do prazer imediato leva à impotência de sentir e viver. Só na espera, na antecipação do prazer futuro que respeita o tempo e o outro, é possível atingir etapas superiores, dos patamares do êxtase. O prazer é algo real e alcançável, mas se o fizermos a todo o custo, somos consumidos pelo prazer, em vez de vivermos com prazer. Este é o destino de todas as adições. A destruição do próprio e das pessoas à volta.
Já o altruísmo, é a verdadeira força que permite vivermos como sociedade. É a mais elevada capacidade humana e a que nos fez sair das trevas do tempo das cavernas. O altruísmo é a única forma de construirmos aldeias, vilas, cidades, países. Pode parecer que é pelo líder carismático que se constroem impérios, mas na verdade, é pelo altruísmo dos cidadãos que estão nas sombras. Todos aqueles que fazem os “trabalhos menores” de agricultura, pecuária, limpeza, construção, … aceitam o seu trabalho e contribuem para a sociedade funcionar. É uma forma de altruísmo e que deve ser valorizado por todos. Existem sempre escolhas que podemos fazer, mas é quando trabalhamos uns para os outros, que todos podemos viver melhor. É esse altruísmo social que é a estrutura que nos permite viver juntos. Mesmo com todo o egoísmo natural e histórico, o altruísmo social tem-se mantido.
O grande desafio é como renovar o altruísmo para as próximas páginas da história? Como nos salvaremos da viragem ao extremo?