Uma eleição e uma canção

Uma eleição (às direitas)

Neste último domingo Portugal falou, e falou sem hesitações e sem contemplações, quer um PSD maior, mas infelizmente, relativo. Também disse que não quer políticas de esquerda, sobretudo se estas forem “sinistras”. Embora a esquerda fofinha e “livre” tenha passado ao lado do desastre, o sinal foi claro. O problema não foi este, o problema foi que na viragem para a social-democracia, os portugueses trouxeram a reboque a social demagogia ressentida. Para quem estivesse atento e acompanhasse a deriva radical de direita nos últimos anos, esta era uma inevitabilidade e tem uma história e uma estratégia que acabou por correr mal aos socialistas e no geral à democracia.

A história vem de alguns anos atrás e começa com uma geringonça artificialmente criada pelo grande estratega luso António Costa, o tal que foi para as europas e que os jornalistas sempre tão assertivos na divulgação de segredos de justiça ainda não conseguiram apanhar para lhe fazer as perguntas que se impõem. A estratégia de Costa era simples e na teoria era infalível, iludir as classes que suportavam as suas bengalas governativas, os comunistas e os bloquistas, enquanto patrocinava um personagem à direita para incomodar e diminuir o PSD. De caminho, o projecto previa também enfraquecer as instituições democráticas e fragilizar todo o sistema político português.

Enquanto Victor Frankenstein, com a sua obsessão pela vida saqueava cemitérios para construir um novo ser, António Costa, obcecado pela sua sobrevivência política, concebia uma criatura que iria devorar o PSD e tudo o que este representava. Em vez de pernas e de braços cozidos, a estranha receita de Costa contava com uma base de ressentimento bem espessa, doses generosas de populismo, uns pozinhos de retórica antissistema e umas pitadas de moralismo. Se juntarmos a tudo isto uma liderança carismática e uma alavancagem mediática a altas temperaturas, obtemos o Chega, o partido do Ventura, o partido dos portugueses de bem, eventualmente, dos portugueses de bem, apenas consigo próprios.

A barragem que António Costa e os seus correligionários construíram na Assembleia da República ao partido Chega era quase pornográfica, o cancelamento político e o repudio exacerbado tinham um fim, a projecção mediática e política de Ventura. As linhas vermelhas, o cordão sanitário e os media instrumentalizados para elevarem qualquer frase de Ventura a blasfémia ou a impropério político foram construindo o Chega, chegando onde ninguém pensava. O conceito inicial era encostar o PSD ao politicamente correcto, limitando a sua acção política e a estratégia até funcionou durante algum tempo, mas depois veio a vingança da criatura sobre o criador, e veio com força, veio com muito força.

Na noite das eleições, na sede do Chega, gritava-se vitória, a certa altura, entoavam de forma imbecil e maldosa: “Chora Pedro, chora Pedro…”. Considerando o nível da turba, entre a claque de futebol e um bando circense não se esperaria outra coisa. Mas para serem justos e mantendo a petulância deveriam ter antes cantarolado: “Obrigado António, obrigado António…”.

Uma canção (perfeita)

Um ser deslocado, na teoria não está fora do seu lugar, está apenas noutro lugar, mas quando o nosso lugar é especial, o lugar de empréstimo, torna-se estranho e às vezes doloroso. A música que os NAPA levaram ao festival da Eurovisão é absolutamente bela e magistral, não só pela sua letra e versos, como pela sua melodia, harmonia e ritmo. Sempre que oiço esta canção fico emocionado e convoca-me uma certa nostalgia, uma nostalgia boa, mas que me embarga a voz. Tenho para mim que os júris do festival, além de serem meios surdos, de certeza que nunca tiveram a mãe a olhar à janela quando estavam a chegar a casa…

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