Estamos novamente em campanha eleitoral, porque Luís Montenegro e o PSD assim o decidiram. Vitimizando-se por não querer prestar informações obrigatórias para quem está na política, Montenegro preferiu lançar uma moção de confiança que já sabia que iria ser chumbada, com a consequente queda do governo e a marcação de novas eleições. Após ser chamado a corrigir a sua declaração de interesses, fê-lo no limite temporal que lhe foi exigido, com a esperança de que não fossem conhecidas as informações que lá constavam antes do dia 18 de maio. Quando percebeu que as suas ligações a pessoas e grupos financeiros ficaram visíveis, reforçou a ideia de que as questões da ética e da justiça devem ser validadas pelas pessoas, nas urnas. Como se uma eleição servisse para decidir questões legais ou do foro jurídico. Esta postura não é novidade. Cheira a déjà vu. Inquieta e preocupa.
Donald Trump baseou-se neste raciocínio para apagar a sua intervenção na invasão do Capitólio, ou nos casos de violência sobre as mulheres ou de corrupção de que foi acusado e condenado. Foi até recompensado com a decisão de completa imunidade no exercício do cargo. Marine Le Pen, ao ser condenada por fraude por utilizar indevidamente fundos europeus, clamou contra os tribunais, não aceitando uma decisão que até se enquadra nos crimes que o seu partido diz querer combater.
Há dias Montenegro afirmou-se como um “farol deste país”, a “luz que ilumina Portugal”. Entretanto, ficámos a saber que aproveitou para nomear administrador da Lusoponte António Ramalho, marido de uma sua ministra, Rosário Ramalho, e pai de uma vice-presidente do PSD, Inês Ramalho. Tudo estrelas do seu mundo laranja, que iluminam Portugal. Usou sem pejo as televisões para introduzir a peregrinação a Fátima da sua mulher em campanha eleitoral. Um encontro fortuito e puramente casual, claro! Para a população portuguesa, não é novidade alguma a ligação da religião católica à política. O cardeal Cerejeira e grande parte do clero fizeram-no ao longo da ditadura. Na RAM, as homilias de certos membros do clero tiveram grande importância na afirmação do PSD como governo regional. Não sei a que é que isto vos cheira, mas a mim, cheira a déjà vu. Inquieta e preocupa.
A propósito da CP, Luís Montenegro declarou que era motivo para rever a lei da greve. Fez também o favor de nos dizer que já não vê as notícias, nem os canais tradicionais. Só os canais de acidentes e desastres. Desvalorizou o jornalismo, uma das bases de um estado de direito. Aliás, já o tinha feito quando afirmou que os jornalistas usavam auricular para repetirem as perguntas que os estúdios os mandavam fazer. Nada de novo. Trump e Netanyahu queixam-se constantemente da informação. Tentam extinguir os apoios e as possibilidades de sobrevivência financeira dos órgãos de comunicação que noticiam e questionam a realidade.
Miranda Sarmento, ministro das finanças, afirmou ao Jornal Económico: “Governo admite ir além de Bruxelas na contenção de despesa” e “Ministério das Finanças reviu em baixa a estimativa de crescimento da despesa líquida para este ano, mas admite usar essa margem para conter mais a despesa do que o definido com Bruxelas até 2028”. Lembrei-me logo de Passos Coelho, ao afirmar que iria além da troika, cumprindo esse desígnio e criando enormes dificuldades à população. São sinais que cheiram a déjà vu. Inquietam e preocupam.
Por enquanto, podemos continuar a escolher quem nos governa. Analisemos a realidade e escolhamos os valores da democracia, da liberdade e da justiça social. Saibamos escolher quem os defende e não quem cheira a ranço e a democracia mal digerida.