O realizador Márcio Laranjeira criou uma minissérie televisiva de ficção, “Casa Abrigo”, a estrear-se no festival IndieLisboa, com histórias de mulheres que tentaram reconstruir uma identidade depois de terem sido vítimas de violência doméstica.
“Casa Abrigo” é uma minissérie de seis episódios, escrita e realizada por Márcio Laranjeira, sobre casas de acolhimento de vítimas de violência doméstica, inspirada em vários testemunhos e histórias de mulheres, incluindo a mãe do realizador.
“Era algo que eu sempre quis escrever. Há uma parte pessoal disso, mas também porque fui percebendo que era algo que afetava muitas outras pessoas. Acho que quando temos uma história pessoal ligada à violência doméstica, facilmente conseguimos detetar pessoas que estão na mesma situação. É uma rede interminável”, afirmou o realizador à agência Lusa.
Márcio Laranjeira queria uma minissérie polifónica, cruzando histórias de várias mulheres que tinham em comum um passado de violência doméstica e a partilha de uma casa.
Na série entram Maria João Pinho, Leonor Silveira, Ana Sofia Martins, Filomena Gigante, Rita Cabaço, dando corpo às narrativas sobre casos de violência e sobre a partilha de habitações temporárias e de resposta de emergência.
“Há um problema sobre as casas serem a solução e não devem ser vistas como tal. Quando comecei a escrever a série, creio que não tinha essa noção. (…) Existem listas de espera, é difícil fazer triagem. E não se resolvem os problemas do outro lado”, ou seja, do lado da aplicação da justiça em relação ao agressor, afirmou Mário Laranjeira.
Na série televisiva, as personagens são diversas e os casos de violência distintos, em contexto familiar, matrimonial e em diferentes idades das vítimas.
“São mulheres sem identidade, têm de começar tudo a partir daí. Isso também foi uma descoberta para mim. Essa foi a história que quis contar. Não quis fazer ‘flashback’ de violência gráfica – sobre o que as levou até ali –, porque elas já trazem violência com elas. E há uma outra história de violência, a violência de construção de identidade, que começa aí”, sublinhou o realizador.
No início de fevereiro, a RTP fez uma apresentação, em Lisboa, de várias séries a exibir este ano na estação pública e “Casa Abrigo” era uma delas. No entanto, questionada pela Lusa, fonte da RTP disse que ainda não tem data de estreia prevista.
Para Mário Laranjeira, é possível que a não decisão da RTP esteja relacionada com o ator Carloto Cotta, que tem um papel secundário na série e sobre quem recai uma acusação pelo Ministério Público de nove crimes, incluindo violação, sequestro, coação sexual e ameaça agravada a uma mulher.
O caso foi divulgado pelo Ministério Público no final de fevereiro, com o semanário Expresso, na altura, a revelar que tinha sido deduzida acusação contra Carloto Cotta, por factos ocorridos em 2023.
Na minissérie “Casa Abrigo”, Carloto Cotta tem um papel secundário e nem sequer é o de uma personagem agressora, como chegou a ser veiculado na comunicação social, disse Mário Laranjeira.
“Eu acho que é extremamente incómoda esta situação [relacionada com o ator Carloto Cotta]. Incomoda bastante e ainda por cima, porque a série, de repente, pode correr o risco de ser cancelada, digamos. Ao cancelar esta série estamos a cancelar testemunho das vítimas”, vincou o realizador.
“Casa Abrigo”, produzida pela Fado Filmes para a RTP, vai ter dois dos seis episódios a serem exibidos no dia 11 no festival de cinema IndieLisboa.