Vivemos na era da hiperconexão, onde nunca estamos sozinhos. A verdade, todavia, é que nos sentimos mais sozinhos que nunca. Temos cem “amigos” online, mas, às vezes, sem amigos para tomar um café, sem qualquer aviso prévio, só porque sim? Quem nos ouviria, de verdade, sem enviar um emoji de empatia automática ou uma resposta apressada entre reuniões?
Vivemos comprimidos num ecrã. Cabemos numa caixa de texto, mensagens curtas, áudios acelerados, afinal quem tem tempo para a entoação natural das emoções? Os stories que desaparecem em 24 horas, são os novos segredos confidenciados. Aceita-se que um coração no Instagram substitua um abraço real, aceitamos uns parabéns já predefinidos pelo Facebook, bem como o mesmo alerta. Pior… É que já estamos habituados a tudo isso e agimos com normalidade.
Quer dizer, quem tem filhos pequenos, terá sempre atividades e sempre com quem partilhar pequenos momentos e também os grandes momentos. As festas da escola, os banhos caóticos, os jantares onde se serve comida e se engole o cansaço. Mas quantos pais se sentem isolados no meio dessa balbúrdia, todos presentes, mas com uma alma ausente?
A nossa paciência evaporou-se. Somos consumidores de tudo – séries, filmes, livros, podcasts, vidas alheias – mas já não temos tempo para saborear nada. Saltamos as “cenas mortas”, acelerando diálogo, quebrando os silêncios, como se pouco interesse tivesse esse silêncio. Os livros acumulam-se, antes nas prateleiras, agora num Kindle qualquer, para aquele dia. Até a música passou a ser o ruído de fundo da rotina da ida de casa para o trabalho, para a escola. Preferimos rolar um feed infinito com qualquer conteúdo descartável, mas sempre à procura de algo sem saber bem o quê.
Perdemos o sabor de espera e da profundidade, o que gera relações efémeras, as economias instáveis, os governos de consumo rápido. O tempo é o inimigo, cada segundo não ocupado é um fracasso, cada silêncio é ensurdecedor. Nesta correria, perdemos o fio que nos ligava aos outros, mas principalmente a nós mesmo.
O mais cruel nisto tudo? É que temos mais e as melhores ferramentas do que nunca, para estar num clique a falar com um amigo doutro lado do Mundo. E rever amigos de infância? E falar com comunidades inteiras. Mas quantas dessas interações ficam? Quantas nos tocam mesmo?
Antes, marcávamos àquela hora e naquele local, para daí a uma semana e lá se estaria, hoje, é preciso uma lembrança, passaram a ser compromissos negociáveis, descartáveis, canceláveis. Recordo-me sempre que o meu tio Paulo marcava encontrar-se com o Élio ao pé da cabine telefónica que existia ali ao pé dos táxis da Casa da Luz, hoje seria impensável ter algo agendado com uma semana de antecedência. Mas agora a tecnologia deu-nos a oportunidade de controlo, mas será que nos roubou a espontaneidade que alimentava as relações?
Não, não quero romantizar o passado. Sou grato pelo presente e tenho esperança no futuro. Adoro a ideia de uma Inteligência Artificial que salve vidas, que nos ajude a viver melhor. Talvez, precisamos de uma nova aprendizagem do afeto e o amor, precisamos de ser nutridos com os afetos. Não podemos ser indiferentes a um vídeo de uma violação, temos de louvar um jovem que defende umas desconhecidas que estavam a ser drogadas, a compaixão pelo, um jovem cuja vida breve valeu a pena pelo exemplo raro.
Mas talvez, precisemos de dias sem planos. Parar, sentir, escutar, tocar… ter esse tempo.
Lembrar que somos humanos e não meras notificações.