Imortal não, eterno Sim

Na semana passada, uma capa do Comércio do Porto circulou como um furacão pelas redes sociais. Nela, uma entrevista fictícia de Pinto da Costa ecoava palavras que pareciam saídas de um script épico: “Há quem pense que o país é só Lisboa, mas estão enganados. Para aqueles energúmenos que me desejam a morte, sorrio, mas não esquecerei. No dia em que for enterrado, o Porto irá chorar, mas Lisboa irá sentir o abalo. Ou não me chamo eu Jorge Nuno Pinto da Costa.” Palavras duras, quase proféticas, que poderiam muito bem ter sido proferidas pelo homem que, durante décadas, personificou a resistência contra o centralismo lisboeta.

E então, num daqueles momentos em que a realidade parece dobrar-se ao mito, aconteceu: enquanto o caixão de Pinto da Costa repousava no Estádio do Dragão, um sismo abalou Lisboa. Coincidência? Talvez. Mas, para muitos, foi como se o próprio cosmos estivesse a render homenagem ao homem que, em vida, fez tremer as estruturas do poder centralizado. E esse poder tantas vezes era encarnado. A capa fictícia tornou-se viral, e as palavras que nela constavam ganharam um peso quase divino.

Pinto da Costa não era apenas um presidente de clube. Era um símbolo, um arquétipo, uma força da natureza.

Para uma geração inteira, ele era o rosto da resistência, o defensor intransigente de um Portugal profundo, aquele que não se verga, não se rende, não se dissolve no brilho efémero da capital tantas vezes provinciana, no sentido em que se rende a modas que vêm da estranja, nem de uma pseudo-moralidade, nem do politicamente correto vergando-se aos interesses da capital do império.

No imaginário coletivo, ele era imortal. Os adversários temiam-no, os rivais invejavam-no, e todos, no fundo, desejavam ter um Pinto da Costa no seu clube. Mas, como todos os grandes mitos, ele não era imortal. Será, sim, eterno.

Além futebol, Pinto da Costa fez mais pela descentralização do país do que muitos políticos que se acomodam nos salões de Lisboa. Lembramo-nos da caricatura do Eng. Passos Ferreira, criada por Herman José no Herman Enciclopédia: os Homens do Norte, reunidos nas caves do Porto, a conspirar contra o centralismo lisboeta. Mas, quando chegaram a Lisboa, perderam o sotaque, perdiam a identidade, perdiam-se, ou, como alguém um dia classificou, de “urbanos-rurais”. Essa sátira, tão portuguesa, é a triste realidade de muitos que sobem a Avenida da Liberdade e esquecem as suas raízes. Pinto da Costa nunca esqueceu. Nem ele, nem Alberto João Jardim, dois titãs que lutaram contra o centralismo com uma coragem rara.

Homenagear Pinto da Costa não é apenas celebrar o melhor dirigente desportivo do Mundo. É reconhecer um homem que lutou pelo Portugal Profundo. Ele valorizou as tradições, a cultura e a identidade de um Portugal que Lisboa muitas vezes ignora. Foi um farol para todos os que acreditam que o país não se resume a uma cidade, mas é feito de muitas vozes, muitas terras, muitas histórias.

E, no final, como disse D. Américo na homilia de despedida: “Ele agora vai interceder junto de Deus. Em termos desportivos não, porque penso que Deus não se mete nessas coisas. Mas se virem outras coisas estranhas a acontecer, já sabem… foi ele.”

Pinto da Costa partiu, mas o seu legado permanece. Não era imortal, mas é eterno. E, enquanto o Porto chorava e Lisboa tremia, o Portugal Profundo soube que um dos seus maiores heróis partiu, deixando para trás um rasto de glória, resistência, resiliência e orgulho. Obrigado, Presidente dos Presidentes. Obrigado por nos lembrar que o verdadeiro Portugal não cabe num mapa, mas vive no coração de quem o defende.

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