O dicionário define o advento como tempo de chegada, de vinda, de aparecimento.
Está relacionado com o Natal mas, de certa forma, é o que se sente quando as máquinas partidárias deitam a roda a andar ou quando algo novo se revela.
Dito assim, quer a pré-campanha eleitoral que se anuncia pesada, quer a chamada de Tolentino Mendonça para celebrar amanhã a missa do Papa remetem para a ideia de um advento fora de tempo e com duplo sentido. O primeiro é sofrível, o segundo é saboroso.
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É um paradoxo: à medida que somamos anos à Democracia e à Autonomia, damos sinais de recuo nos valores conquistados em meio século.
O direito à crítica, por mais dura que seja, tem sido abalroado pelo recurso ao enxovalho público. A denúncia está a ser esmagada pela ofensa primária. Volta e meia, o bom nome é esmigalhado pela sentença anónima.
É política, dizem uns!
É campanha, atiram outros!
Não é nada, devíamos dizer todos!
É apenas barulho que substitui a falta de ideias.
Facilmente se confunde a campanha com atos e atitudes que ultrapassam a linha que separa o bom senso da política rasteira.
O mais avisado, sobretudo dos partidos com maiores responsabilidades, seria ignorar essas novas formas de ganhar visualizações à conta do pretenso escândalo. Mas, infelizmente, isso nem sempre acontece.
Há exemplos antigos e recentes de más práticas de comunicação aconselhadas por autoproclamados gurus na arte de apanhar eleitores.
O famoso cartaz do PS, que troca as propostas próprias pela denúncia da aliança entre PSD, CDS e Chega, foi um exemplo polémico que ensaiou uma estratégia de duvidosa eficácia. O que fica é uma ideia solta à semelhança de um pequeno partido de protesto. E o PS devia ser mais do que isso.
Depois veio a multiplicação dos cartazes do Chega a anunciar o fim dos tachos e da corrupção, justamente na altura em que o partido mais pratica os pecados que denuncia.
Neste campeonato do mau gosto, o Chega volta a insistir e mostra cartazes com a cara do presidente do governo e umas quantas notas de euros afirmando que é tempo de acabar com isto. Essa é a parte verdadeira. É tempo de acabar com este discurso trauliteiro.
Mas eis que alguém se lembrou de passar uma rasteira ao líder do PSD e Miguel Albuquerque caiu. Ao aceitar fazer aquele número dos binóculos para ver as casas que o JPP não fez, o PSD mostrou que está pronto para a brincadeira.
Já esta semana, ao reagir ao cartaz da mala, o PSD confirmou disposição para esse caminho perigoso. E o PSD devia ser mais do que isso.
A campanha ainda nem começou e já não faltam sinais de que teremos pela frente dois meses duros, seguidos de um curto intervalo e nova ronda para as Eleições Autárquicas.
Neste frenesim, talvez fosse útil quem manda nas campanhas deitar contas à vida. Isto ajuda a atrair ou a repelir votos e eleitores?
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Longe deste palco escorregadio onde atua a política regional, muito longe mesmo, está um dos mais ilustres madeirenses. José Tolentino Mendonça volta a ser notícia. O cardeal é chamado a ocupar amanhã o lugar do Papa Francisco na missa de domingo, no Vaticano.
Não é coisa pouca a empreitada que recai sobre o madeirense que tem feito um percurso notável em várias áreas do saber. Tolentino tem crescido nos mistérios da fé, é ouvido enquanto pensador, é lido e dito enquanto poeta. É certo que a missão que lhe cabe amanhã nasce pela fragilidade da saúde de Francisco. Até pode ser uma coincidência. Mas é mais um sinal do respeito da Igreja Católica por um dos madeirenses mais ilustres. E isso deve orgulhar-nos a todos. Três vezes todos, como disse Francisco quando visitou Lisboa, talvez lendo o que lhe escrevera Tolentino.