Maria Teresa Horta (MTH) foi desobediente e inspirou gerações de Mulheres a desobedecer – talvez sejamos mesmo natural, e felizmente, desobedientes, para mais num mundo que tende a secundarizar a mulher, a inferiorizá-la e a engavetá-la nos menores compartimentos sociais. E não se julgue, conforme oiço amiúde, sobretudo por parte de alguns homens, que os nossos direitos estão consolidados e que as desigualdades de género (sim, são desigualdades pelo mero género!) são questões do passado. Não são, na verdade além de presentes são reemergentes, pelo crivo de algumas forças políticas que até já nem escondem que nos querem de regresso ao “recato do lar”- quem não tem memória recente do livro “Identidade e Família”, que ataca claramente “a ideologia de género, com o amparo de figuras como Passos Coelho (o mesmo de quem, por cujas mãos, MTH recusou receber um prémio literário), André Ventura, entre outros, que definiam e defendiam um perfil conservador e tradicional para o que denominam de “instituição familiar”.
O machismo, a par de outros atentados aos direitos humanos, é para se combater, e para desobedecer aos seus ditames de crueldade contra outrem. E já o mencionei outras vezes: não se julgue que o machismo atenta só contra as mulheres; este, discrimina igualmente os “homens que choram” e os homens que não se pautam pelos pressupostos cada vez mais absurdos, e ridículos, da dita virilidade. O machismo, contra o qual MTH tanto guerreou, é uma “agremiação” inumana e terrorista que ao longo da História (mas agudizada por estes tempos…), perseguiu e queimou mulheres em fogueiras, trancou-as em casa e silenciou-as na História. Hoje, muitas de nós – e não necessariamente em terras distantes regidas por preceitos islâmicos – em pleno séc. XXI e no denominado ocidente, morrem, assassinadas pelo machismo que as assume como propriedade do domínio masculino; que as quer submissas aos imperativos do conservadorismo; que as ridiculariza quando se expressam pela inteligência – porventura, porque os machistas, na verdade, são homens inseguros? E será por medo que nos gritam: “são as bruxas!” – como bem denunciou MTH no seu poema “Voamos”?
Uma perda como a de MTH é impossível que se traduza em ausência porque Mulheres como ela, Senhoras de Si, escapam à morte e perduram. Ficou dela, mesmo na tristeza que qual pegada nos circunscreve pela sua morte, todo um espólio de resistência, de lutas, de Liberdade(s), seja por atos, seja pela escrita. E por escrita, é este o tempo para retornar à leitura do livro Novas Cartas Portuguesas, redigido por “três Marias”, que soube rebater os valores femininos do fascismo de Salazar, desafiando o regime da altura, além de ter inscrito o feminismo na história de Portugal. E se é verdade que é um manifesto político e feminista, reivindicativo dos direitos humanos – porque os direitos das mulheres são direitos humanos! – é também uma obra de incontestável valor literário (reúne poesia, prosa, ensaio, cartas, contos e até romance). Obra, que se tornou justamente num dos maiores símbolos contra a ditadura que tantos machistas (homens e mulheres – que há lamentavelmente mulheres que também o são…) querem resgatar.
Honremos todas (e todos) o legado destas Mulheres e sejamos também Senhoras de nós, desobedientes e cientes dos nossos direitos. Para bem da Humanidade!
(OBRIGADA!, Maria Teresa Horta).