Crise de lideranças

“Quando a crise não é geradora

de grandes audácias, mais indicado

é dar-lhe o nome de agonia”

Natália Correia

Em janeiro de 2024, a Madeira mergulhou numa crise política sem precedentes. Um ano depois, é fácil assumir que não tínhamos noção do impacto que este evento teria na vida política regional.

É verdade que não é a primeira vez que isto acontece – quem não se lembra do processo “Cuba Livre”? –, mas é a primeira vez que mergulha a Região numa crise de legitimidade das lideranças partidárias, no seu todo.

A literatura científica é clara: as crises de legitimidade afetam diretamente a autoridade dos líderes. A este respeito, é interessante acompanhar o debate iniciado por Norris (2011) – argumenta que a legitimidade política nas democracias contemporâneas está em declínio devido ao crescente afastamento entre cidadãos e instituições.

Em contexto de crise política, todos os partidos enfrentam o mesmo dilema: manter as suas lideranças, arriscando uma erosão da confiança pública, ou iniciar um processo de clarificação interna.

Isto não é novo. Aconteceu precisamente após a crise de janeiro de 2024. Os partidos, transversalmente, durante o ano de 2024, ou agora no início de 2025, foram a eleições internas. Então, porque é que os intervenientes são exatamente os mesmos que em 2024 (salvo escassas exceções)?

É difícil não nos questionarmos porque é que os congressos partidários conduzem, de forma reiterada, aos mesmos resultados.

Não coloco em causa a legitimidade das lideranças, de todo. Nem me refiro apenas ao líder de cada um dos partidos que se apresentam a eleições regionais antecipadas. O que está em causa é, precisamente, a estratégia das lideranças – logo, de todo um grupo de intervenientes perfeitamente identificados.

Algo tem de mudar consideravelmente para que o resultado eleitoral também mude.

Caso contrário, viveremos em contínua crise de legitimidade do poder, com um exponencial crescimento do populismo que só vem alimentar radicalismos. São estes atores, populistas, radicais, caraterizados por uma ideologia de ‘baixa densidade’, que vão ganhando terreno e colocam em causa tudo o que a democracia alcançou – basta olhar para o que D. Trump está a fazer.

A realização de eleições antecipadas com apresentação dos mesmos atores e intervenientes políticos que faziam parte do panorama político regional à data dos diversos momentos de crise, reflete um problema estrutural mais amplo: a dificuldade (ou falta de vontade) dos partidos em promover uma renovação efetiva num contexto de desconfiança generalizada. Tal deve suscitar preocupação a todos nós acerca da capacidade das elites políticas em restaurar a confiança dos cidadãos e garantir a estabilidade democrática.

A recuperação da confiança pública depende de sinais claros de mudança. Admitindo a premissa de que “em equipa que ganha, não se mexe”, importa também considerar que a legitimidade das lideranças políticas em períodos de crise não pode ser apenas uma questão de continuidade eleitoral. Deve assentar na capacidade dos partidos de demonstrar um verdadeiro compromisso com a regeneração democrática, com a ética e moral na governação. Esse é um sinal que tem de ser dado aos madeirenses.

É habitual dizermos que uma crise é uma oportunidade para nos posicionarmos e decidirmos caminhos. São precisas lideranças que compreendam o tamanho dos passos que ainda temos de dar para garantirmos aos nossos filhos os direitos que temos vindo a conquistar – não falo de messias, falo de pessoas capazes, que queiram fazer melhor, sem populismos e promessas inexequíveis. Pessoas capazes de dar o passo seguinte.

Leave a comment

Your email address will not be published. Required fields are marked *