O FC Porto perdeu 50 milhões de euros (ME) em comissões acima dos referenciais da FIFA ou dos padrões de mercado associadas a transferências de futebolistas na última década, segundo a auditoria forense publicada hoje pelo clube.
Na análise feita pela consultora Deloitte às 879 transações dos ‘dragões’ nas 10 épocas anteriores, entre 2014/15 e 2023/24, foi contabilizado um montante total de 158 ME em comissões acordadas, havendo maior contribuição das saídas (46%), entradas (37%) e renovações (16%), contra uma representação ínfima dos empréstimos e das rescisões.
A existência de 27% de saídas e 61% de entradas com valores de comissões acima dos referenciais levou a 38,4 ME de comissões em excesso, enquanto 95% das renovações analisadas superaram o limite de 3% do salário bruto, totalizando 11,5 ME de excessos.
O documento enviado à agência Lusa com as sínteses das conclusões da auditoria diz ainda que metade das comissões (80 ME) foram atribuídas a apenas oito agentes, com 35% concentrado nos três principais intermediários – a Gestifute, de Jorge Mendes, a PP Sports e a N1 Carreiras Desportivas, ambas de Pedro Pinho, e a Bertolucci Assessoria.
Houve também 16 mandatos de exclusividade concedidos a cinco agentes, alguns dos quais sobre os atletas mais valiosos do plantel, restringindo a liberdade de negociação.
Aprofundando a análise de 55 transferências auditadas, 51 não tinham documentação de suporte, tais como relatórios de prospeção ou justificações para contratação, e 41 apresentaram comissões acima dos referenciais, sendo ainda identificados pagamentos de comissões pendentes relativos a 23 atletas, num total de 15,8 ME em incumprimentos.
Além das transações de futebolistas, a auditoria forense revelou irregularidades na venda de bilhetes para jogos do FC Porto aos Super Dragões, uma das claques, e às casas do clube, estimando perdas de 5,1 ME em 2017/18, 2018/19, 2021/22, 2022/23 e 2023/24.
Os Super Dragões averbaram dívidas de 2 ME em relação a ingressos não restituídos ao FC Porto e uma perda de 1,45 ME em faturas não elegíveis à luz do protocolo, tendo utilizado de forma indevida recursos do clube para pagarem viagens pessoais a membros e familiares da direção da claque rumo a destinos onde não existiam jogos dos ‘dragões’.
Ainda sob a esfera daquele grupo organizado de adeptos, que deixou de ser liderado em 2024 por Fernando Madureira, um dos arguidos na Operação Pretoriano, eram atribuídos com regularidade descontos não autorizados aplicados sobre o valor facial dos bilhetes vendidos para os jogos do Estádio do Dragão, resultando numa perda de 850 mil euros.
Já o impacto financeiro da oferta indevida de ingressos consumada pelos Super Dragões aquando de partidas com grande relevância comercial de bilheteira cifrou-se nos 340 mil euros.
Diversas casas do FC Porto também atuaram na venda de bilhetes sem fornecer dados legais obrigatórios, causando perdas de 81 mil euros, abaixo dos 110 mil resultantes do excesso de ingressos comercializados face à bolsa média permitida, restringida a 2.500.
A última área de gestão analisada denunciou 3,6 ME de despesas de representação não elegíveis em consonância com o regulamento interno da SAD, mas que foram usufruídas por anteriores administrações da sociedade gestora do futebol profissional dos ‘dragões’.
As 10 temporadas investigadas pela Deloitte reportam ao período em que Pinto da Costa liderou o clube e a SAD, cargos que deixou de exercer em 2024 ao fim de 42 e 27 anos depois, respetivamente, após ter sido derrotado por André Villas-Boas nas eleições mais participadas da história portista, com o antigo treinador a prometer uma auditoria forense.
“A auditoria forense revelou fragilidades e irregularidades sérias na gestão do clube nos últimos anos, com decisões e comportamentos que causaram impactos financeiros e reputacionais muito significativos”, lamentou o FC Porto, num dia em que os associados tiveram acesso prioritário ao documento através do portal da transparência dos ‘dragões’.
O processo iniciou-se em maio de 2024, aquando da tomada de posse dos novos corpos sociais da SAD, e começou por atentar nas “principais irregularidades” decorrentes das últimas duas épocas, antes de a “relevância das evidências encontradas e a necessidade de avaliar tendências históricas” levar ao aprofundamento da análise a partir de 2014/15.
“As atuais administração e equipa de gestão têm o compromisso de adotar as medidas necessárias para minimizar ou mitigar os impactos negativos, procurar o ressarcimento sempre que tal for possível, e prosseguir a colaboração com a justiça nos processos em curso”, finalizou.