O meu dia a dia é rodeado por homens. Trabalho com eles, discuto com eles, rio com eles, emociono-me e celebro com eles. É verdade, as discussões parecem autênticos diálogos de surdos. Lutamos, argumentamos, irritamo-nos e, no final, descobrimos que até estávamos de acordo. É como naquela velha ideia em que os portugueses entendem os espanhóis, mas os espanhóis “no entienden ni hablan nada de português”. Neste cenário, as mulheres são os portugueses, esforçando-se para serem compreendidas, e os homens são os espanhóis, que, por vezes, parecem nem tentar ouvir.
Recentemente, li um livro recomendado por um antigo chefe: “Os Homens são de Marte e as Mulheres são de Vénus”. Sei que há muitos outros livros sobre o tema, mas este é um bom ponto de partida para perceber questões básicas que, por puro desconhecimento, nos levam a cometer erros de comunicação recorrentes. Como, por exemplo, acreditar que só porque algo nos faz sentir bem, vai automaticamente funcionar com outra pessoa.
A igualdade de género não deve ser uma questão de uniformizar comportamentos, nem pode esquecer que, mesmo quando queremos atingir o mesmo objetivo, homens e mulheres têm necessidades e formas de comunicar diferentes.
Nunca me senti vítima de sexismo descarado, mas ele existe. Às vezes de forma subtil, outras vezes escancarado, mas quase sempre disfarçado de “brincadeira” ou de “é só uma piada”. Na maioria das vezes, usei o meu humor para cortar o assunto ou afastei-me rapidamente. E não, não estou aqui para dizer que os homens são os maus da fita, porque, curiosamente, muitos desses comentários vêm de mulheres. Questões culturais, resistência à mudança e, às vezes, até um sentimento de ameaça contribuem para este tipo de comportamento.
Cresci numa família onde não existiam tarefas “de homem” ou “de mulher”. Arrumar a casa era para todos. A minha irmã e a minha mãe cortavam lenha ao lado do meu pai. Eu era mais de limpar a rua como se não houvesse amanhã. Se era para carregar peso, carregava-se. Se era para estender roupa, estendia-se. Se era para beber uma cerveja e rir às gargalhadas, lá estávamos todos. Talvez isso se deva ao facto de a minha avó materna ter ficado viúva cedo, com sete filhos para criar. Não havia espaço para caprichos ou divisões de género. A minha mãe levou consigo essa herança, e eu faço por dar-lhe continuidade.
O meu pai e o meu irmão foram os primeiros homens que influenciaram a forma como vejo o mundo. A minha mãe dizia (baixinho, para ele não ouvir e ficar convencido) que, para os anos 80, o meu pai era um homem fora de série. O meu irmão levava-me aos concertos com os amigos dele. O aviso era claro: “É para se divertir, mas respeitinho se faz favor!” E era um aviso mútuo, para mim e para eles.
Pelo caminho outros homens incentivaram-me e continuam a incentivar-me a seguir o meu caminho. Não é sorte, nem “subir na horizontal”. Faço para que ninguém tenha a responsabilidade de adivinhar o que me faz feliz. É preciso falar, explicar, ouvir e consentir que nos amem como sabem. Às vezes resulta, outras não.
Talvez a chave esteja exatamente aí: na capacidade de fazermos o esforço para chegar ao outro, na vontade de construir relações cada vez mais humanas, únicas e dignas de nos sentirmos vivos.