Desacatos na Grande Lisboa provocam debate tenso no parlamento

Autocarro em chamas no Bairro do Zambujal, Amadora

Os desacatos que se têm registado na Grande Lisboa provocaram hoje um debate tenso no parlamento, com várias interrupções e trocas de acusações sobre discursos incendiários, em particular entre as bancadas do Chega e do Bloco de Esquerda.

Durante o período de intervenções políticas na Assembleia da República, uma intervenção do líder parlamentar do BE, Fabian Figueiredo, provocou várias interrupções e críticas, após ter afirmado que a morte de Odair Moniz na segunda-feira, após ter sido baleado pela PSP, não é um caso isolado, elencando outros seis casos em Portugal de mortes por violência policial.

“Em Portugal, é 21 vezes mais provável uma pessoa ser morta pela polícia se for negra, é cinco vezes menos provável aceder ao ensino superior se for negra, é 26% mais frequente uma pessoa negra exercer uma profissão pouco qualificada com mais esforço físico”, frisou, provocando várias críticas da bancada do Chega, que levaram Fabian Figueiredo a afirmar que “de um lado está o Chega, do outro está o Bloco”.

“Como de um lado está a polícia autoritária e, do outro, a polícia democrática”, afirmou.

Esta intervenção mereceu críticas imediatas por vários deputados dos partidos de direita, com o líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, a condenar “todos os desacatos” e “comportamentos criminosos” a que se tem assistido nos últimos dias, mas também aqueles que, com responsabilidades políticas em órgãos de soberania, “se comportam como gasolina num incêndio”.

“O que assistimos agora aqui é vergonhoso, e eu queria repudiar o que foi feito às forças e serviços de segurança do nosso país pelo BE”, disse, com o líder da IL, Rui Rocha, a também considerar que a intervenção de Fabian Figueiredo foi “gravíssima”.

“Senhor deputado Fabian Figueiredo, eu nunca vi abutres resolverem incêndios nem desordem, os abutres alimentam-se do caos e da desordem e, quando já só restam destroços, abandonam o local para outra tragédia de que se possam alimentar. Foi isso que o senhor aqui fez, isso é indigno”, acusou.

Antes, numa intervenção política, Rui Rocha já tinha acusado a “esquerda radical de atirar achas para a fogueira da revolta”, da mesma forma que a direita radical, “de forma simétrica, alimenta a ideia de que a violência policial é sempre legítima e inquestionável”.

Já o Chega, pela voz do deputado Rui Paulo Sousa, respondeu ao BE citando o caso de Irineu Diniz, “agente da PSP, que tinha 33 anos quando foi assassinado com 22 tiros na Cova da Moura, emboscado por traficantes e abatido a sangue frio”.

“Três autocarros da Carris foram incendiados nas últimas duas noites na Cova da Moura, carros foram danificados e vandalizados, as pessoas têm medo de sair à rua. O que é que o BE tem a dizer sobre isso? Será que tem a dizer alguma coisa ou é só para defender os bandidos que têm voz neste parlamento?” perguntou, com a coordenadora do BE, Mariana Mortágua, a acusar o Chega de “promover e banalizar” crimes de ódio.

Pelo PS, o deputado Pedro Delgado Alves lamentou que, durante estas intervenções, não se tenha visto empatia nem capacidade de se compreender o outro e dirigiu-se ao Chega para os acusar de “instrumentalizar o debate” e “tentar criar equivalências onde elas não existem”

Já o deputado do PCP António Filipe salientou que é importante “repudiar todos os atos de violência, venham de onde vierem”, considerando que “não é com fogos que se apaga a gasolina e o que é preciso é um apelo à serenidade e à tranquilidade”.

Pelo Livre, o deputado Rui Tavares defendeu que, para se evitar que novos acontecimentos desta natureza se reproduzam na Grande Lisboa, é preciso “uma ação muito mais integrada de acompanhamento” das populações, salientando que, em bairros como a Cova da Moura, “há muita falta da parte do Estado”.

A deputada única do PAN, Inês Sousa Real, defendeu que é preciso valorizar as forças de segurança, criticando “o discurso oportunista de achar que é com medalhas que se resolvem estas circunstâncias”.

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